Os desafios de Obrador no México ( e fora dele)
O nacionalista de esquerda Andrés Manuel López Obrador, também conhecido como Amlo, assume neste sábado (01/12) um país em que a crise está por todos os lados: a criminalidade atingiu o auge no México, a confiança nos políticos e nas instituições desceu ao nível mais baixo, o Estado de Direito está em coma, e as perspectivas para a economia permanecem incertas após a renegociação do Acordo de Livre Comércio da América do Norte – rebatizado para Acordo Estados Unidos-México-Canadá – em que o México obteve condições piores.
A classe baixa quer agora se beneficiar dos frutos do progresso e espera uma ascensão social; a classe média quer transparência e Estado de Direito; e a classe alta, estabilidade sem aumentos de impostos. Todos exigem mais segurança.
"O maior desafio dele será ajustar essas expectativas à realidade", acredita o analista Ricardo Alvarado, da organização Mexicanos Contra a corrupção e a Impunidade. O programa de 25 pontos de Amlo parece ser uma lista de desejos: ele planeja, sem novos endividamentos, uma refinaria, duas ferrovias, cem novas universidades, um novo aeroporto, uma duplicação da aposentadoria mínima estatal, soberania alimentar, reflorestamento, bolsas de estudo para estudantes e um sistema de saúde gratuito para todo o país.
"Se você juntar tudo isso, o orçamento explode", avalia o cientista político Rubén Aguilar. Ele acredita que as reais prioridades vão aparecer durante as negociações orçamentárias no Congresso. Muitas propostas dificilmente serão realizadas sem a cooperação do setor privado. Entretanto, Amlo irritou os empresários quando enterrou o projeto, já em fase de construção, de um novo aeroporto para a capital mexicana, através de um plebiscito polêmico, organizado por correligionários. Em vez disso, uma base da Força Aérea já existente deve ser remodelada.
Pouco depois, deputados de sua coalizão – muitos dos quais estão claramente à esquerda de Amlo –, propuseram estatizar fundos de pensão e proibir taxas bancárias. As afirmações derrubaram o peso e o mercado de ações. Aparentemente Amlo tem esperanças de que a China possa, se necessário, dar um apoio como investidora – o que, por sua vez, poderia irritar o principal parceiro comercial, os EUA. O presidente dos EUA, Donald Trump, está conduzindo uma guerra comercial contra o gigante asiático e tenta conter a influência da China no vizinho latino-americano.
Combate ao narcotráfico
Para o jornalista José Gil Olmos, a prioridade não deveria ser a economia, mas a luta contra o narcotráfico, que constitui um estado dentro do Estado. "De nada adiantam todos os projetos ferroviários, aeroportuários e programas sociais se você não encarar esse câncer que decompôs a sociedade e o Estado", escreve ele no semanário crítico Proceso.
Nesta área, o novo chefe de Estado, ao contrário de suas promessas de campanha, aposta em velhos conhecidos: os militares. Ele quer criar uma guarda nacional, comandada pelas Forças Armadas e diretamente subordinada a ele. Porque, na sua opinião, a espiral de violência é causada pelo declínio moral e a liderança fraca que abriram as portas à corrupção da polícia e dos políticos pela máfia.
Se as mudanças constitucionais necessárias para a criação da guarda nacional conseguirão a maioria apropriada no Congresso e serão aprovadas pela Suprema Corte é algo que está em aberto. Mas até agora não há um plano B na política de segurança.
A proposta recebeu, além disso, duras críticas. Organizações da sociedade civil já veem sua segunda preocupação – a desmilitarização da guerra contra as drogas – fracassar depois que Amlo rejeitou uma procuradoria-geral independente. "Assim, haverá, como de costume, um procurador-geral controlado pelo presidente, e o presidente vai decidir em qual direção e até que ponto casos de corrupção serão investigados", diz Aguilar.
Amlo já enfatizou repetidamente que os ex-presidentes suspeitos de corrupção não serão penalizados, porque ele não querer fazer uma "caça às bruxas". Recentemente, ele sugeriu, gerando indignação pública, deixar que o povo decida sobre o assunto através de uma votação – o que, para Alvarado, é algo completamente alheio ao Estado de Direito. "Isso é demagogia. Justiça não é algo sobre o qual se possa votar."
Concentração de poder
Mas plebiscitos têm o seu significado na lógica de Amlo, pondera a cientista política Daniela Stevens, do Centro de Estudos Latino-Americanos e Latinos da American University, sediada em Washington. "Eles parecem servir para legitimar as intenções de Amlo e fortalecer seu poder. Ele e seu partido parecem acalentar planos de minar os contrapesos que controlam o presidente." Alvarado tem opinião semelhante. "Amlo é muito desconfiado e aposta na recentralização do poder. Mas a concentração em poucas mãos é intransparente e aumenta o risco de corrupção."
Um sinal disso são, de acordo com Aguilar, os "delegados" recém-nomeados pelo presidente em cada estado mexicano, que devem controlar, entre outras coisas, os programas sociais, atuando como uma espécie de poder paralelo aos governadores eleitos.
Aguilar também vê com preocupação a polarização crescente da sociedade, alimentada por alguns funcionários com a retórica "ou você está comigo ou é contra mim". "Uma terra tão dividida entre dois polos não avança. A primeira grande tarefa de Amlo é quebrar essa lógica. Caso contrário, tempos difíceis nos esperam."
(Com a DW)
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