O VOO EXEMPLAR DE UM AMIGO

                                                                         


Carlos Lúcio Gontijo

         Comentários baseados em enredos referentes a atitudes, gestos e comportamentos que sirvam de exemplos à sociedade brasileira tão carente de lideranças positivas deveriam ocupar mais espaços em nossos meios impressos de comunicação, mergulhados em insossos pontos de vista políticos, que nada acrescentam, pois que aprisionados a preferências partidárias e radicalismos ideológicos, através dos quais assistimos à tentativa de provar a existência de ladrão honrado e compromissado como o sonho de um Brasil socialmente justo.

          Sempre cultivei (e cultivo) o maior apreço por meus amigos e tantos leitores que me acompanham ao longo dos últimos quarenta anos. Dentro do possível, mantenho uma agenda com o endereço de vários companheiros de Redação e do inesquecível período de labuta no Departamento de Revisão dos jornais Diário da Tarde e Estado de Minas, onde durante muitos trabalhei madrugada adentro, arrebanhando grandes amizades, que resistiram ao tempo.

          Semana passada, liguei para o jornalista Magnus Martins Pinheiro, ao qual tive a alegria de comandar quando fui supervisor de Revisão. Magnus é hoje professor, prestes a se aposentar, do curso de Jornalismo da Universidade Federal do Estado do Piauí, com sede em Teresina. Por duas vezes estive por lá a fim de visitá-lo, fazendo questão de jamais perder contato. Enquanto ele, por outro lado, veio a Santo Antônio do Monte, assim que para cá eu me mudei.

          Magnus não faz segredo da luta que trava com um câncer resistente há uns três anos e, mesmo sob o peso de diagnóstico cruel determinando a impossibilidade de cura, ele não fechou as portas para a vida. Há muita gente que, mesmo diante do sol, desacredita na luz, ao passo que meu amigo Magnus vislumbra galáxia inteira em qualquer ponto de claridade.

          Surpreendentemente, ele ainda se atém ao trabalho de preparar e dar aulas, escrever artigos para jornais e peça para teatro. Num gesto de amizade, consideração e afeto, Magnus leva textos de minha autoria aos seus alunos e, ainda recentemente, fez questão de elogiar o livro infantil “Beijoaria” e o romance “Desmemória de horizonte”, no qual se deteve emocionado na página em que lembro o saudoso amigo Elias Maboub.

          Magnus luta há tanto tempo contra a sentença médica que já se tornou especialista e estudioso do mal de que padece, cuidando de buscar auxílio em todas as formas e experimentos naturais capazes de lhe ampliar a resistência orgânica à doença. Dessa maneira, em vez de marcado para morrer, ele se fez marcado para viver.

          Todavia, o que mais tem contribuído para que o professor universitário se mantenha ativo é o apoio advindo da família, principalmente da esposa Leda, que lhe tecem uma malha de proteção que se junta à sua capacidade de compreensão plena perante as vicissitudes da vida terrena, que é tão breve e não pode ser abreviada ainda mais pela depressiva entrega às lamentações.

          Sabedor de seus limites e limitações, Magnus não se deixa desanimar, construindo dias que, magicamente, têm mais de 24 horas, de tal exuberância que vão ao encontro de frase que grafei no romance “Lógica das borboletas”: Assim como as borboletas, somos paisagem em movimento: não estamos no mundo para marcar tempo de vida, mas horas de voo...

          Carlos Lúcio Gontijo

          Poeta, escritor e jornalista

          www.carlosluciogontijo.jor.br

         20 de julho de 2017.

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