Venezuela: O ABC da Assembleia Nacional Constituinte

                                                                                       

Pablo Siris Seade

Este domingo 30 de Julho o povo venezuelano determinará através do seu voto a integração de uma Assembleia Nacional Constituinte. Mas fará muito mais do que isso: decidirá se vence o terrorismo fascista ou escolhe a paz como forma definitiva de resolver os assuntos do pais e avança rumo à construção de uma nova sociedade mais justa, livre e próspera. 

1. O que é uma Assembleia Nacional Constituinte? 

É um mecanismo previsto nas constituições de vários países do mundo para a sua transformação. 

Normalmente o povo elege para integrá-la com um número extraordinário de pessoas (mais do dobro dos que tem o Poder Legislativo) a fim de considerar a referida modificação da Carta Magna. 

É mais profunda que as emendas ou reformas, as quais normalmente não afectam aspectos da Constituição e realizam modificações pontuais. 

2. Quem pode convocar a ANC na Venezuela? 

O artigo 348 estabelece que pode ser convocada pelo Poder Executivo, por uma maioria especial do Poder Legislativo (dois terços), por uma maioria especial dos representantes dos municípios (novamente dois terços) ou directamente por não menos de 15% do eleitorado. 

O artigo seguinte assinala que o Presidente não pode de modo algum objectar ao resultado da mesma e que os outros Poderes do Estado "não poderão de forma alguma impedir as decisões da Assembleia Constituinte". 

A nova Constituição emanada da Assembleia que for eleita será plebiscitada e todo o povo poderá exprimir-se quanto à mesma. 

3. Por que o presidente Nicolás Maduro convocou uma ANC? 

No último 1º de Maio o presidente venezuelano Nicolás Maduro convocou a ANC "com a finalidade primordial de garantir a preservação da paz do país diante das circunstâncias sociais, políticas e económicas actuais, em severas ameaças internas e externas de factores anti-democráticos e de marcada postura anti-pátria pairam sobre sua ordem constitucional". 

No decreto correspondente minci.gob.ve/... o presidente Maduro exprimiu os objectivos da referida convocatória. Estes são: 
1. A paz como necessidade, direito e anseio da nação, o processo constituinte é uma grande convocatória a um diálogo nacional para conter a escalada de violência política, mediante o reconhecimento político mútuo e de uma reorganização do Estado, que recupere o princípio constitucional de cooperação entre os poderes público (...)  

2. O aperfeiçoamento do sistema nacional rumo (...) ao novo modelo da economia pós petrolífera, mista, produtiva, diversificada, integradora, a partir da criação de novos instrumentos que dinamizem o desenvolvimento das forças produtivas, assim como a instauração de um novo modelo de distribuição transparente que satisfaça plenamente as necessidade de abastecimento da população.   

3. Constitucionalizar as Missões e Grandes Missões Socialistas, desenvolvendo o Estado democrático, social, de direito e de justiça (...) 

4. A ampliação das competências do Sistema de Justiça, para erradicar a impunidade dos delitos, especialmente aqueles que se cometem contra as pessoas (...); assim como os delitos contra a Pátria e a sociedade tais como a corrupção; o contrabando de extracção; a especulação; o terrorismo; o narcotráfico; a promoção do ódio social e a ingerência estrangeira. 

5. Constitucionalização das novas formas da democracia participativa e protagónica, a partir do reconhecimento dos novos sujeitos do Poder Popular, tais como as Comunas e Conselhos Comunais, Conselhos de Trabalhadores e Trabalhadoras, entre outras formas de organização de base territorial e social da população. 

6. A defesa da soberania e da integridade da nação e protecção contra o intervencionismo estrangeiro, ampliando as competências do Estado democrático, social, de direito e de justiça para a preservação da segurança cidadã, a garantia do exercício integral dos direitos humanos, a defesa da independência, da paz, da imunidade e da soberania política, económica e territorial da Venezuela. Assim como a promoção da consolidação de um mundo multipolar e multicêntrico que garanta o respeito ao direito e à segurança internacional.  

7. Reivindicação do carácter pluricultural da Pátria, mediante o desenvolvimento constitucional dos valores espirituais que nos permitam reconhecer-nos como venezuelanos e venezuelanas, na nossa diversidade étnica e cultural como garantia de convivência pacífica no presente e rumo ao porvir (...) 

8. A garantia do futuro, nossa juventude, mediante a inclusão de um capítulo constitucional para consagrar os direitos da juventude, tais como o uso livre e consciente das tecnologia de informação, o direito a um trabalho digno e libertador das suas criatividades, a protecção à mães jovens; o acesso a uma primeira habitação; e o reconhecimento à diversidade (...) 

 9. A preservação da vida no planeta, desenvolvendo constitucionalmente, com maior especificidade os direitos soberanos sobre a protecção da nossa biodiversidade e o desenvolvimento de uma cultura ecológica na nossa sociedade. 

4. Como se escolheram os candidatos e quem os vota? 

A votação será organizada pelo Conselho Nacional Eleitoral e o sufrágio será universal, directo, secreto e voluntário. 

Cada município do país elegerá um constituinte, as capitais de estado terão dois representante o Distrito Capital sete, totalizando 364 constituintes que serão eleitos territorialmente. Para ser candidato, os pré candidatos deverão contar com o apoio de 3% dos inscritos no Registo Eleitoral do âmbito territorial correspondente. 

Apresentaram-se mais de 50 mil pré candidatos, dos quais cumpriram o requisito prévio cerca de cinco mil. 

Haverá também oito constituintes em representação dos povos originários da Venezuela, os quais elegerão de acordo com seus usos e costumes ancestrais. 

Será realizada também a eleição por sectores, à razão de um constituinte por cada 83 integrantes (aproximadamente) dos diversos sectores a considerar, o qual levará até 545 o número total de integrantes da ANC. 

Os sectores em que serão eleitos representantes para a ANC (além dos povos indígenas, já mencionados9 serão: trabalhadores, camponeses e pescadores, estudantes, pessoas com incapacidade, jubilados e pensionistas, empresários e – finalmente – conselhos comunais e comunas. 

Nos sectores, a candidatura será realizada por listas nacionais que contarão com o respaldo de 3% dos integrantes do padrão eleitoral correspondente ao referido sector, exceptuando os integrantes dos conselhos comunais e comunas que também serão eleitos territorialmente. 

5. Por que se escolheu este mecanismo de eleição de candidatos? 

A Constituição da República Bolivariana da Venezuela estabelece nos seus diversos artigos que o Estado deve tender a uma democracia participativa e protagónica, coisa que ao longo dos 18 anos da Revolução Bolivariana foi um dos principais objectivos de todo o povo venezuelano. 

Por isso mesmo surgiram diversas formas de organização política territorial e sectorial como os conselhos comunais, as comunas (que agrupam várias destas), os conselhos de trabalhadores nas empresas de propriedade social, os conselhos de pessoas com incapacidade, o crescimento explosivo das organizações estudantis, entre outras. 

A convocatória à ANC, portanto, não pode senão reconhecer estas novas formas de organização social e contribuir para o seu desenvolvimento. 

6. O que fará a ANC quando for instalada? 

A Constituição da República Bolivariana da Venezuela ( cne.gob.ve/web/normativa_electoral/constitucion/indice.php ) assinala no seu artigo 347 que "O povo da Venezuela é o depositário do poder constituinte originário. No exercício do referido poder pode convocar uma Assembleia Nacional Constituinte com o objectivo de transformar o Estado, criar um novo ordenamento jurídico e redigir uma nova Constituição". 

O seja, que – diferentemente de outros países, mas tal como em 1999 – a ANC venezuelana depende só de si mesma e pode encarar todas as modificações do texto constitucional que entenda pertinentes com os objectos expressos mais acima no texto constitucional. 

A ANC considerará os diferentes projectos e contribuições que os constituintes coloquem, assim como os efectuem as cidadãs e cidadãos através de diferentes mecanismos de consulta que se estabeleceram. 

O resultado dos debates será referendado através de uma instância eleitoral convocada especificamente para esses efeitos. 

7. Serão resolvidos os problemas da Venezuela quando for instalada a ANC? 

Não. Os problemas da Venezuela são o resultado da guerra com o imperialismo norte-americano e seus lacaios locais (e em alguns outros lugares) que procuram garantir para os Estados Unidos o controle do petróleo venezuelano como recurso estratégico, assim como provocar uma redistribuição negativa da renda que o petróleo produz para que volte ao domínio de umas poucas famílias. 

Entretanto, esta ampla instância de participação e debate nacional permitirá que a mais ampla expressão popular possa fazer valer suas opiniões e encontre instrumentos para garantir o anseio de paz do povo venezuelano e aprofundar o desenvolvimento produtivo do país e a justiça social. 

Diante daqueles que pretendem instaurar a violência e o terror como forma de dirigir os destinos do país, a oferta é dirimir democraticamente e através do voto os diferentes pontos de vista. 
28/Julho/2017

Ver também: 
A CIA e a contra-revolução na Venezuela , Atilio A. Borón
O que significa CIMA? , Néstor García Iturbe
Frente Popular anti-imperialista e antifascista , PCV, PPT, REDES, PRT, BRAVO SUR, VOCES y GAYONES
Venezuela, entre o chavismo e a restauração colonial , Jorge Beinstein
En Venezuela se hace necesaria una victoria Constituyente , Carlos Aznárez
Contra viento y marea ¡va la Constituyente! , Gilberto López y Rivas 

O original encontra-se em www.resumenlatinoamericano.org/... 

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

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