Como ficaria uma eleição sem Lula? (Uma análise da "Deutsche Welle")
Mais candidatos, eleitorado pulverizado, quadro similar ao de 1989, Bolsonaro perdendo parte do apelo antipetista: alguns cenários diante de uma eventual ausência do ex-presidente na corrida ao Planalto.
Protesto contra o ex-presidente Lula em São Paulo, no dia da decisão que confirmou sua condenação
Protesto contra o ex-presidente Lula em São Paulo, no dia da decisão que confirmou sua condenação
Luiz Inácio Lula da Silva viu suas chances de disputar novamente a Presidência diminuírem após a confirmação unânime da sua condenação por corrupção e lavagem de dinheiro. O ex-presidente arrisca se tornar definitivamente um "ficha suja" e ficar fora do pleito.
O exercício especulativo de uma eleição sem Lula representa um desafio até mesmo no mundo político. "No cenário político brasileiro de hoje, você fazer uma análise para daqui a 24 horas está difícil. Imagina para outubro então, parece quase impossível”, disse na quinta-feira (25/01) o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
Especialistas ouvidos pela DW Brasil apontam que é difícil apontar quem seria decisivamente beneficiado por uma eventual ausência de Lula e qual nome tem agora mais chances de vencer a corrida presidencial. É possível apontar, no entanto, alguns dos efeitos sobre o processo. Um deles seria a entrada de novos candidatos.
"Com Lula de fora, novos nomes podem acabar entrando na eleição, tornando tudo mais imprevisível", afirma o cientista político David Fleischer, da Universidade Nacional de Brasília (UnB). Alguns deles seriam outsiders ao estilo do apresentador Luciano Huck que podem pipocar para tentar abocanhar o vazio deixado pelo petista.
Fleischer ainda diz que nomes como o do governador Geraldo Alckmin (PSDB) e o do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles (PSD), continuam pouco competitivos, mesmo sem Lula na disputa, e que qualquer plano B do PT que considere a transferência de votos para outro candidato da sigla não deve prosperar.
"Lula já não tem mais a mesma força como cabo eleitoral. Basta ver o que aconteceu com o PT em 2016. O partido deve encolher ainda mais neste ano", opina.
Pulverização
O analista Oliver Stuenkel, da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP), também aponta que, com Lula fora da disputa, a tendência é um cenário de pulverização, com muitas candidaturas dividindo entre si fatias largas do eleitorado, repetindo o que ocorreu em 1989.
Ele aponta, no entanto, que a entrada de aventureiros ainda não será decisiva e que o velho establishment político, mesmo acossado pela Lava Jato, ainda demonstra força para influenciar a disputa. Dessa forma, mesmo sem Lula, ainda não haveria vez para radicais como Jair Bolsonaro e eventuais outsiders fora do universo político.
"O dinheiro, a influência e a presença nos Estados e municípios ainda são fundamentais em uma disputa nacional. Não é a vez dos paraquedistas", diz.
Transferência de votos
Ricardo Ismael, do Departamento de Ciências Sociais da PUC-Rio, aponta que alguns candidatos como Ciro Gomes (PDT) e Marina Silva (Rede) podem num primeiro momento pegar alguns dos votos de Lula, mas que a tendência é que o eleitorado do petista se pulverize.
Ele também duvida da capacidade de Lula de transferir votos para um candidato do próprio PT. "Fernando Haddad seria o candidato mais forte para tomar o lugar, mas o Lula atual não é o de 2010, aquele com a máquina e imagem com menos rejeição", diz. "Ao insistir em Lula até as últimas consequências, sem garantia de que ele será candidato, o PT sabota a chance de formar alianças, que são decisivas em uma eleição."
O cientista político Carlos Pereira, da FGV-Rio, aponta que, sem Lula, a tendência é que o segundo turno inclua dois candidatos de centro, sem a presença da esquerda (petista ou não).
Segundo ele, é provável que um desses candidatos seja do PSDB e o outro do próprio governo Michel Temer, que deve recuperar a influência no processo por causa da melhora da economia. "Sem Lula, a esquerda vai perder espaço", completa.
Já Ismael, da PUC-Rio, afirma que com Lula ou sem Lula, dificilmente o governo Temer terá forças para promover um candidato próprio. Mas o governo pode pelo menos influenciar o processo.
"Temer não é nem Sarney - um presidente que chegou ao fim sem influência - ou um Itamar - que teve força decisiva para influenciar o pleito seguinte -, mas uma melhora da economia pode ajudar candidatos que defendam a continuidade das suas políticas", comenta.
Bolsonaro
No início de dezembro, o instituto Datafolha traçou os primeiros cenários sem Lula na disputa. Neles, o populista de direita Jair Bolsonaro (PSL) assumiria a liderança ficando com pelo menos 21% dos votos. Nos cenários ainda com Lula, o candidato direitista apareceu com 17% e 19% dos votos.
Só que segundo Carlos Pereira, da FGV-Rio, Bolsonaro paradoxalmente deve perder espaço em uma disputa sem Lula. "Ele vai esvaziar por não fazer parte de um partido com capilaridade no país e porque seu apelo depende muito de se apresentar como um anti-Lula”, assegura.
O cientista político Rodrigo Prando, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, concorda, mas faz uma ressalva: "Bolsonaro também vai murchar, mas não vai estar totalmente fora porque suas bandeiras de lei e ordem e família ainda têm apelo junto a uma fatia do eleitorado", diz.
Divisão
O Datafolha também mostrou que, sem Lula, muitos votos vão ser transferidos para outros candidatos, muitas vezes de perfil completamente diferente. "Isso mostra que o eleitorado é do Lula, e não do PT. É um eleitorado heterogêneo", diz Ismael, da PUC-Rio.
Um dos maiores beneficiários da saída de Lula seria o ex-ministro Ciro Gomes, que ideologicamente é mais próximo de Lula. Sem o petista, Ciro passa de entre 6% e 7% para 12% e 13% das intenções, dependendo de quem são seus adversários.
A ex-ministra Marina Silva, uma veterana de disputas presidenciais, também ganha competitividade. Aparecendo com até 11% das intenções de voto em um dos cenários ainda com o petista, ela passa para até 17% na hipótese de Lula ficar de fora.
O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, é outro que, segundo a pesquisa, obtém vantagem. Com no máximo 9% das intenções de voto nos cenários com o petista, ele passaria para até 12%.
Para outros pré-candidatos ou possíveis candidatos, como Álvaro Dias (Podemos), João Dória (PSDB) e Manuela D'ávila (PCdoB) e Meirelles, a saída do petista também pode significar um incremento de votos, embora com menos impacto do que com outros candidatos. Nenhum deles passa de 6% das intenções de voto sem Lula até o momento.
Mais chamativo é o fato de que, sem Lula, o número de votos em branco e nulos dispara. Nas simulações com o petista, entre 12% e 14% afirmam que não pretendem votar em ninguém. Sem Lula, esse percentual sobe para 25% a 30%, o que sugere que muitos votos não vão migrar automaticamente para alguma outra figura e que todos os pré-candidatos têm bastante campo para tentar ampliar seu apelo junto ao eleitorado.
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(Com a Deutsche Welle)
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