Repressão ao Sindicato dos Bancários do Rio é lembrada em audiência da CNV e da CEV-Rio
O Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro já possuía grande notoriedade junto à categoria e ao movimento sindical antes do golpe militar de 1964 e isso explica a intensa repressão que o órgão sofreu por parte do regime militar. Essa história foi lembrada ontem (19/11), em audiência pública realizada pela Comissão Nacional da Verdade e pela Comissão da Verdade do Rio. O evento, que aconteceu na sede do sindicato, no Centro do Rio, ouviu o depoimento de quatro lideranças do sindicato que militaram entre 1964 e 1972.
"Atividades como essa, que falam com a sinceridade dessas histórias, preparam o caminho para a verdade maior que é a Justiça. Sinto-me animada por essa luta de justiça quando revisitamos e recordamos essa fase brutal que foi a ditadura. Estou profundamente honrada de estar na sede do Sindicato dos Bancários na presença de companheiros importantes para o movimento", disse Rosa Cardoso, membro da Comissão Nacional da Verdade e coordenadora do grupo de trabalho Ditadura e Repressão aos Trabalhadores e ao Movimento Sindical.
A primeira intervenção no Sindicato dos Bancários aconteceu logo após o golpe, ainda em 1964, e durou dois anos. Prisões e demissões foram efetuadas e os membros da então diretoria tiveram seus cargos cassados. Em 1966, sob intensa repressão, foi realizada eleição para a direção do sindicato. A chapa vencedora, que sinalizava para a resistência à ditadura, foi impedida de tomar posse.
"Em 1º de abril de 1964 essa casa foi invadida e depredada e saímos às ruas porque a luta era lá. Fui preso pela primeira vez nessa época. Fiquei sete dias no Dops (Departamento de Ordem Política e Social) e quando fui liberado encontrei (no banco) uma carta de transferência para Porto Alegre. Entrei na Justiça, disse que era perseguido político, e ganhei a causa", lembra Auri Gomes da Silva, atuante no sindicato desde 1950, e preso três vezes durante a ditadura militar. A pior fase, segundo ele, foi depois da promulgação do Ato Institucional nº 5, em 1968, pelo então presidente Costa e Silva.
"Tivemos que recuar com o AI-5. Fui preso novamente e levado para o DOI-Codi, onde fui submetido à tortura. Primeiro me colocaram em uma cela, seminu, conhecida por geladeira. Um alto-falante ficava ligado o tempo inteiro e o som que saia era de uma pessoa rindo. Passei dez dias sofrendo com esses atos violentos: socos, pontapés, além da tortura psicológica. Não cansavam de repetir que iam seqüestrar e estuprar minha esposa e minhas filhas. A intenção era que a gente caísse com essas ameaças", afirmou Auri.
Além de Auri, outros três companheiros bancários prestaram depoimento: Jorge Couto, Edmilson Martins de Oliveira e Samuel Henrique Maleval que, pela primeira vez, deu seu testemunho em público. "Algumas pessoas pensam que a tortura e as prisões começaram muito depois de 64, mas não. Nos primeiros dias do golpe, eles entraram no sindicato, quebraram tudo, nos prenderam e torturaram. Foi uma humilhação terrível e não podíamos fazer nada", disse Samuel que, por conta da tortura, tem o movimento da mão comprometido.
Para o presidente da Comissão da Verdade do Rio, Wadih Damous (desenho), o objetivo de realizar atividades como o Testemunho da Verdade é dar voz àqueles que foram vítimas e contar a história que os livros omitem: a repressão e perseguição aos sindicatos.
"Já ouvi diversas pessoas dizerem que a ditadura no Brasil, se comparada com outras, como Argentina e Chile, foi uma "ditabranda", porque a nossa teria sido menos violenta. Acredito que a ditadura brasileira foi a mais eficiente e seu legado continua presente até hoje. Toda polícia é violenta, mas a nossa polícia, na democracia, ainda mata, tortura e desaparece com corpos. Por isso é importante, e é esse o trabalho das comissões da verdade, montar uma narrativa que dê conhecimento a uma geração que não sabe o que aconteceu durante a ditadura", afirmou Wadih Damous.
O Testemunho da Verdade contou ainda com a presença dos membros da Comissão da Verdade do Rio, Geraldo Cândido, coordenador do Grupo de Trabalho Repressão aos Trabalhadores e ao Movimento Sindical da CEV-Rio, e Álvaro Caldas; do presidente do Sindicato dos Bancários, Almir Aguiar, e de diversas lideranças do movimento sindical, além do deputado estadual Gilberto Palmares. (Com a Comissão Nacional da Verdade)
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