E agora, o que fazer?

                                                                                             
                                                                                     Daniel Kondo

Luis Felipe Miguel (*)

O golpe no Brasil mostra como a democracia, mesmo limitada ao processo eleitoral, incomoda as classes dominantes. Mostra também que as forças progressistas não podem jogar todas as suas esperanças nas eleições ou na luta dentro das instituições. 

A disputa municipal de outubro é importante por oferecer um espaço de denúncia e de discussão. É importante também tentar eleger bancadas democráticas e progressistas nas Câmaras de Vereadores, para garantir uma tribuna e impedir retrocessos que ocorrem no âmbito municipal, como nos planos de educação. Mas canalizar a maior parte das energias para a disputa eleitoral, seja agora, seja em 2018, é uma armadilha.

De fato, as eleições funcionam, muitas vezes, como uma forma de restabelecer a legitimidade de um regime de dominação que está sendo questionado, anulando experiências de maior radicalidade e “normalizando” a política. 

Mesmo que um candidato mais à esquerda volte à Presidência em 2018, retornará em condições piores, seja porque o retrocesso acelerado da presidência Temer estará realizado, seja porque o golpe sinalizou com ainda maior clareza os limites que as classes dominantes impõem à disputa política. 

Uma ação política com sentido transformador tem, ao contrário, de recusar essa “normalização”, mantendo a pressão das ruas e forçando as fronteiras da ordem instituída. Ficou demonstrado que essa ordem é organizada de maneira a proteger privilégios e que braços do Estado, como a polícia ou o Judiciário, permanecem fortemente alinhados aos interesses dos grupos dominantes.

A opção desmobilizadora dos governos do PT, que buscaram até o final acomodar as elites tradicionais e evitar o confronto, mostrou seus limites. Na hora em que foi necessário buscar apoio das bases populares, elas estavam desorganizadas e foi difícil recolocá-las nas ruas. 

A defesa da democracia contra o golpe só ganhou força nos momentos finais, sobretudo após o episódio dramático da tentativa de prisão (“condução coercitiva”) do ex-presidente Lula. Só aí começou a ser forjada a necessária unidade diante do inimigo comum, que precisa ser preservada para a desobediência civil cotidiana ao governo ilegítimo.

A estratégia de acomodação mostrou-se particularmente equivocada no que se refere aos meios de comunicação de massa. Os governos de Lula e Dilma promoveram avanços muito tímidos na área e recuaram na defesa da democratização da mídia, temendo a reação das empresas do setor. 

Nem por isso conseguiram um mínimo de neutralidade da grande imprensa, que foi participante ativa do golpe, por meio da manipulação da informação. O protagonismo da mídia na crise política mostra que para as forças progressistas é crucial promover um ambiente de informação mais plural, em que a agenda possa ser disputada. 

Não basta fazer circular interpretações alternativas da pauta dos meios hegemônicos, como hoje faz a imprensa alternativa, sobretudo na internet. É necessário haver uma articulação que permita dar ressonância a uma agenda informativa diferente.

(*) Luis Felipe Miguel é professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília.

(Com o Diário Liberdade)

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