Entre os países mais processados na CIDH, Brasil não doa à entidade desde 2011
Brenno Grillo
Apesar de ser o oitavo país (de um total de 35) com mais representações na Corte Interamericana de Direitos Humanos até 2015 — com 405 petições aguardando análise — o Brasil não envia recursos financeiros à entidade internacional desde 2011. Esse é o maior período sem doações da série histórica, que começou há 10 anos.
Nem a presença de um brasileiro na direção da comissão desde 2014, o comissário Paulo Vannuchi, que permanece no cargo até 2017, impediu o Brasil de ficar os últimos seis anos sem contribuir com órgão.
Antes deste período haviam sido apenas dois anos sem remessas financeiras (2007 e 2010). Em 2006 foram enviados US$ 98,5 mil; em 2008, US$ 300 mil, que foi a maior quantia registrada; e US$ 10 mil em 2009.
As 405 petições apresentadas contra o Brasil deixam o país à frente, por exemplo, da Venezuela (161), que enfrenta uma grave crise político-econômica. Na outra ponta da lista estão nações como o México (2.539) — que possui diversas denúncias de assassinatos cometidos por traficantes de drogas e de pessoas — e a Colômbia (1.888), que enfrenta problemas com as forças paramilitares há décadas.
Sem relação
O número de petições na CIDH não tem relação nenhuma com o total a ser doado pelos países. Em 2015, os maiores contribuintes foram os EUA (US$ 2 milhões), o Canadá (US$ 75,9 mil), a Argentina (US$ 60 mil) e a Colômbia (US$ 50 mil). Esses países ocupam, respectivamente, a 9ª, a 20ª, a 4ª e a 2ª posições na lista de países com maior número de representações.
Se os montantes destinados à CIDH por essas quatro nações forem comparados com os valores destinados em 2013 — ano em que o total de países contribuintes foi similar — são percebidas retrações de 22%, 88%, 85% e 59%. Na última semana, a CIDH informou que cortará 40% de seus funcionários e a suspenderá algumas audiências por falta de recursos.
Dados da corte mostram que as doações vêm caindo gradualmente desde 2013, quando a instituição recebeu US$ 5,9 milhões, chegando US$ 2,8 milhões em 2015. Essa variação negativa de 52,5% em três anos veio depois de os recursos diminuírem 18% entre 2013 e 2014, e 27% entre 2014 e o ano passado.
Em 2016, apenas quatro países-membros da Organização dos Estados Americanos doaram à CIDH. São eles os EUA (US$ 2,4 milhões), a Argentina (US$ 40 mil), o Uruguai (US$ 24 mil) e o Peru (US$ 5 mil).
Abrangência dos direitos humanos
O conceito de Direitos Humanos tornou-se algo muito abrangente, fazendo com que, em certas causas, sejam questionadas violações, que num primeiro momento não parecem ter relação com o tema. Um exemplo disso é um processo em que o Brasil e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) são questionados por demorarem a julgar um processo envolvendo a Ambev.
É questionado no caso o suposto desrespeito à ordem econômica pela empresa. Segundo a autora da ação P- 439-14 Brasil, a advogada Maristela Basso, as práticas da empresa fizeram com que muitos distribuidores de cerveja perdessem seus negócios por serem obrigados comprar mais de uma marca de cerveja.
A advogada, que representa 40 ex-distribuidores de cerveja, conta que seis mil empresários do ramo teriam sido afetados. Consta da peça apresentada por ela que antes de a companhia existir os comerciantes podiam escolher quais produtos comprar. Porém, a empresa teria alterado essa regra.
“Com a AmBev, passou ter que comprar as duas cervejas”, diz Maristela Basso, complementando que “o Cade determinou as exigências, mas não as fiscalizou”. Ela afirma ainda que, antes de recorrer à CIDH, os distribuidores tentaram acionar o Supremo Tribunal Federal para questionar os atos da empresa, mas não conseguiram, por por não terem personalidade jurídica para questionar preceito fundamental.
Esse tipo de questionamento só pode ser feito por sindicatos, pelo procurador-geral da República e pela Ordem dos Advogados do Brasil. A advogada destaca que a ação está sob análise da corte há 11 anos, e que, nos últimos tempos, recebeu certa prioridade na tramitação. “As mortes de muitos [distribuidores] fizeram com que o processo subisse na pilha.”
Durante esses 11 anos, foi discutida a necessidade de o Cade constar como parte na ação. O órgão de regulação questionou sua participação por se tratar de um debate entre particulares, e não uma briga concorrencial. Questionada pela ConJur, a Ambev disse que não comenta casos em andamento. O Itamaraty também foi perguntado sobre as doações feitas pelo Brasil, mas não respondeu.
(Com a Conjur)
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