Um dia, umas Comadres

                                                                      

José Carlos Alexandre

Vou te contar. Melhor: vou revelar um dos melhores dias que minha secular memória registra  em seu recanto meio visível. 

A tarde passada num casarão dos anos 50/60 no Bairro da Graça. Onde? 

Em frente a um estabelecimento de saúde. Com mesas no passeio, entradinha com muitos largas-me-deixas, repartido em salinhas repletas de mesas, cadeiras, fotografias e muita, mas muita musica. 

Seu nome: Murangueiro. 

Com "u" mesmo, bem charmosinho,  reproduzido nas camisetas dos garçons e do proprietário, que veste também uma boina muito bem transada, se é que me entende...

Pois lá, dependendo do dia , ou talvez mesmo de quem liga reservando mesas, chega e ter ritmos dos mais variados. Tem samba dos melhores, bolero para nenhum coroa reclamar e choro para agradar  deus-e-o-diabo-na terra-das-alterosas.

Dei a sorte de ir numa tarde de bamba. De samba que me fez lembrar da Lapa do Rio. Das noites de Santa Teresa e do tempo da sopa-do-Zarur, com  o Expedito Militar, o João Batista da Coletoria Estadual, do prefeito José Ernesto e outras personalidades em Brumadinho, no século anterior ao do rompimento da barragem da Vale.

O comando do samba  "muringueiro" estava com mulheres. E que mulheres, todas deixando a platéia entre boquiaberta e estupefata!

Dizza Franco parecia liderar tudo, ditando o ritmo, cantando, se relacionando com clientes e convidados , distribuindo doses iguais de sorrisos e simpatia, ao lado das companheiras. 

Mais do que companheiras: Comadres. Este o nome (quer mais sugestivo?):Comadres, diz tudo. Parecem que vivem  perenemente a  ensaiar e passar o som, quando estão somente entre elas, no convívio fora  do show que proporcionam a quem tenha o privilégio de assisti-las.

A Eliane faz de seu violão um encanto maior que todos os paraísos já descrito em livros sacros ou profanos, da Bíblia com sua Torá ao "Inferno" de Dante, com sua Beatriz inimaginável. 

E as vozes inconfundíveis de Ângela e Dizza se somando ou surdo de Ana/? É de se incomodar novamente os Garços para que jamais deixem os copos vazios e os cozinheiros parados...

Pois  no Murimgueiro ´é  como se tudo de magnífico não parasse de acontecer, nem que uma bomba dessas que alguns governadores ameaçam despejar sobre populações trabalhadoras de comunidades fosse erar o alvo e cair sobre toda a freguesia...

Ah! Tarde jamais acontecida nesta BH que todos amamos.

Dessa terra que me acolheu de braços e sambas estendidos, eu que venho da pauliceia desvairada e da  luta mais do que exemplar dos mineiros de Nova Lima e Raposos, os "moscovitas", que deram lições de sindicalismo ao mundo.

E  que por vezes me refugio em Santa Tereza dos Bares do Museu do Clube da Esquina e das mesas do terreiro do Lúcio, ao som inigualável dos filhos do Velho Salim: Lô, Marilton, Márcio e demais Borges.

Sosseguem todos e todas. Sou quase que uma ave sem ninho no que toca a lugares para ir, para frequentar. Ando de um lado para outro, Ou de UBer ou no meu antiquíssimo "Tornado". 

Não paro nem na Savassi, nem na Casa dos Contos ou em Santa Tereza. 

Danço comigo mesmo ou na Ágora ou do que dela dizem que restou, em Atenas ou no Inhotim, em Brumadinho. 

Tomo meu daiquiri no "La Floridita em Havana ou uma boa dose de pinga, no Morro do Montevidio, em Nova Lima

E agora posso ir de patinete ao Miringueiro, pegando carona para voltar ao Alípio de Melo onde moro.

Um modo sem-par de viver...

Comentários

As Comadres são realmente uma beleza. Mais de duas horas de MPB, de Vinícius de Morais, passando por Clara Nunes e Eles Regina. Para completar uma galinhada dos céus . Muringueiro bom demais!