INGENUIDADE OU MÁ-FÉ?

Hermínio Prates ( *)

A imprensa vive de verdades ou semeia equívocos? Entre a ingenuidade de uns e a esperteza de outros, não se deve tropeçar nas entrelinhas para não cair nas armadilhas dos que defendem a liberdade, desde que a panacéia não limite os lucros de uns e o poder de outros. Ou os dois para um só, pois de benesses vive a nossa elite.
Quem me lê já percebeu que a arenga se refere à colheita dos votos, pois a eleição de uns representa a vitória da manipulação de falas e fatos, além de ser um engodo para os bobocas que ainda acreditam nos duendes dos palanques. Para outros – diria um niilista debochado – é apenas uma loteria.
Como sou um curioso militante, sempre comparo a campanha eleitoral dos candidatos mineiros e paulistas e tanto cá, como lá, o festival de promessas se repete. O que mais aprecio são os nomes arrevesados de uns e a bazófia de outros, ambos assegurando o reino das delícias para os que lhe confiarem o voto. A imprensa – por não querer ou poder - nada faz para denunciar o ridículo, ficando a tarefa para a descontraída internet, território dominado pelos que esgrimem com arte e liberdade a crítica e o deboche sem limites.
E como o passado também ensina, há quem mergulhe no pretérito nada perfeito de alguns pais da pátria, de onde se extraem atos nunca exemplares. Lembra-se do dileto neto do senhor nariz de bolota, de quem acabam de comemorar o centenário de nascimento? A charada se explica pela citação de dois nomes: Tancredo Neves (o avô e mestre das rasteiras de bastidores) e o pupilo Aécio, gestor do marketing de verbas fartas. Pois agora me refiro à escolha – eleição? – do Aécio Neves para a presidência da Câmara. Na época, influentes nomes da mídia mineira vieram com aquela bobagem de que “finalmente Minas voltava ao comando da Câmara, 30 anos depois”. Esses “30 anos depois” se reportavam à era em que a Câmara foi presidida por José Bonifácio de Andrada e Silva, da ARENA, o partido dos militares golpistas, filhos espúrios do udenismo safado. Minas “esteve” no poder com o Zezinho Bonifácio, da quarta geração dos sugadores do mandonismo. E daí? O “prestígio” do Andrada era tão insignificante que os militares nem gostavam de mostrar os quepes por aqui.
Antes da vitória do sobrinho-neto do Tancredo o lobby foi bravo: vai ser isso, seremos aquilo... Pois bem, o ex-garoto de São João del Rei assumiu o posto e só nos restou aguardar as benesses, que nunca vieram. Logo depois, como governador forjado pela mídia bem abastecida, também não veio o metrô, nem as estradas, as escolas, os hospitais. A insegurança é pública e notória, com o tal antes e com o parceirinho Anastásia agora. A gestão foi má para o funcionalismo e excelente para os cofres, que financiaram as faraônicas obras do “centro administrativo”. Asseguram os bem informados que quando o vovô Tancredo assumiu o governo mineiro os emissários dos empreiteiros apareceram com projeto idêntico.O Tancredo trancou o papelório em uma gaveta e nunca mais se falou naquele escoadouro de verbas públicas. Anos depois, o netinho sucumbiu e lá se foram bilhões de reais que teriam sido mais proveitosos se investidos em feitos sociais e não torrados na fogueira das ilusões políticas. Ora, ora, se o vovô quase foi, o neto sonha ser. A presidência é o limite!
A estratégia tucana sempre é a de querer ser mais ético do que os monges, mas ninguém suporta mais ver a boca do José Serra arrotando sofismas. Sobre a quebra de sigilo da filha dileta, o escalado para perder a corrida presidencial fez uso e abuso de possíveis safadezas de um despachante e quis a todo custo transferir o crime para Dilma Roussef.
Quem mais quer saber, boa leitura fará de reportagem assinada pelo jornalista Leandro Fortes, publicada pela revista CartaCapital, edição número 613. Em 30 de janeiro de 2001, o então presidente da Câmara, Michel Temer, pediu a Armínio Fraga, presidente do Banco Central, explicações sobre a quebra de sigilo de 60 milhões de pessoas. “O site responsável pelo crime era da filial brasileira de uma empresa Argentina que se chamava Decidir.com e, curiosamente, tinha registro em Miami, Estados Unidos, em nome de seis sócios. Dois deles eram empresárias brasileiras: Verônica Allende Serra e Verônica Dantas Rodenberg”. A primeira Verônica é a que agora está no púlpito televisivo, santificada que foi pela mídia domesticada; a segunda é irmã de Daniel Dantas, aquele mesmo do Opportunity, gestor de um golpe bilionário durante o desgoverno de FHC.
Um mês após o pedido de explicações, Armínio nada informara e Temer foi sucedido por Aécio Neves na presidência da Câmara. A partir daí, nada mais se falou, pois os tucanos bateram bicos em surdina. Imagina: FHC presidente, Serra ministro, Aécio chefiando o legislativo. Silêncio total, a mídia nada viu de errado, apenas jogou um pouco da lama nas costas de meia dúzia de deputados, flagrados com cheques sem fundo na praça. Um deles, o folclórico e não menos espertalhão Severino Cavalcanti, mais tarde seria eleito presidente da Câmara, com entusiástico apoio dos tucanos.
Querem mais estranheza? Por que a imprensa que se crê grande nada fala sobre a podridão, também envolvendo espionagem, no Palácio Piratini, sede do governo gaúcho? Ah, a governadora Yeda Crusius é do ninho tucano? Entendo.
O cidadão e indefeso pagador de impostos não teme a total quebra de seu sigilo. ”Quem não deve não treme e nada teme”, assegura o cumpridor de deveres cívicos. Será que a pupila do Serra teme alguma coisa?
Serei um caçador de tucanos? Ledo engano. Minha espingarda-polveira não seleciona alvos e atira à direita e à esquerda; atinge uns por privilegiarem a safadeza, outros por frustrarem sonhos alheios. Sou perfeccionista e, se pudesse, implantaria um dedo no Lula, basta cabeleireira no Serra, aliviaria o semblante da Dilma e, certamente, doaria alguns litros de óleo de peroba para o cara de pau do Aécio.
Prossigo.Será que a “ingenuidade” é tão grande que não percebem o óbvio? O importante não é o local de nascimento do vitorioso e sim a tribo que ele freqüenta. Paulo Maluf, de São Paulo, Collor de Mello, das Alagoas, José Sarney, do Maranhão ou Aécio Neves, de Minas Gerais, é tudo gente da mesma elite, que, inexplicavelmente, goza das simpatias da mídia de cada recanto, por dela serem donas ou com verbas públicas cevarem. Ou de toda a mídia nacional, se for conveniente.
Repito a pergunta inicial; pretensos formadores de opinião são ingênuos ou fazem do lobby uma profissão? Se o paciente leitor não concordar com nenhuma das hipóteses, há uma terceira: o escrevinhador é um maledicente bobo da província; província que é a terra prometida pelos deuses da tucanagem, com muito incenso, alguma birra e nenhum louro, pois a vitória não nos pertence.

(*) Herminio Prates é jornalista
herminioprates@ig.com.br

(Imagem:Google/Internet/Divulgação)

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