Empresários paulistas são denunciados por trabalho escravo em MG
Fiscalização encontrou mais de 2600 trabalhadores submetidos a condições degradantes e ilegais de trabalho em fazendas de cana de açúcar no sul de Minas Gerais
O Ministério Público Federal em Minas Gerais (MPF/MG) denunciou 10 pessoas – entre elas, quatro empresários de um grupo econômico composto pelas empresas Alvorada do Bebedouro SA Açúcar e Álcool, Absolut Participações Ltda, Agrícola Monções Ltda e Asthúrias Agrícola Ltda – por redução de trabalhadores à condição análoga à de escravo e formação de quadrilha.
José Oswaldo Marques Júnior é presidente da Alvorada do Bebedouro, que também pertence a seu pai José Oswaldo Marques e a seu irmão Adézio José Marques. A Absolut participações, acionista da Alvorada do Bebedouro, possui o mesmo quadro societário.
Já a empresa Asthúrias Agrícola, controlada pela Absolut, tem por diretor Adézio José Marques. A Agrícola Monções, por sua vez, é dirigida por Adésio Maria Marques, irmão de José Oswaldo Marques.
O grupo econômico explora, como se fosse uma só empresa, inclusive com constantes migrações internas de empregados, atividades de plantio, manutenção e corte de cana-de-açúcar, para a produção de álcool, açúcar e energia.
Durante fiscalizações realizadas pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Ministério Público do Trabalho (MPT) e pela Polícia Federal nos anos de 2008, 2011 e 2012, foram encontrados, no total, 2.637 trabalhadores submetidos a regime de trabalho escravo.
As vítimas eram aliciadas pelos chamados “gatos” em cidades do norte de Minas Gerais e do interior do nordeste. Só da cidade de Vicença, em Pernambuco, foram trazidos 200 trabalhadores pelo acusado Givanildo José da Silva, preposto dos empresários.
Iludidos pelas promessas de altos salários, condições boas de trabalho e fornecimento de moradia, famílias inteiras, algumas com crianças de três anos de idade, deixavam suas cidades para trabalharem em fazendas situadas nos municípios de Guaranésia, Arceburgo e Monte Belo, no sul de Minas Gerais.
Ao chegar, as vítimas eram levadas para alojamentos em condições precárias, muitos deles em locais improvisados, sem quaisquer condições de conforto, privacidade e higiene. Em Arceburgo/MG, as moradias coletivas, alojando inclusive esposas e filhos, eram divididas em cômodos improvisados, separados apenas por lençóis e cobertores. No alojamento mantido pela Asthurias Agrícolas S/A, o local destinado ao banho não dispunha de portas nas baias, obrigando os trabalhadores a tomarem banho vestidos de cuecas.
Foram encontrados 1.572 empregados sem nenhum registro em carteira de trabalho, livro ou sistema eletrônico. Algumas vítimas ainda tiveram suas carteiras de trabalho retidas.
Além disso, os empregados instalados no alojamento Castelo Branco, em Arceburgo/MG, que tinha capacidade para 300 pessoas, não podiam deixar o local em razão de dívidas assumidas em uma espécie de cantina, que era gerenciada por outro preposto dos empresários.
O local, situado a três quilômetros da usina, não era atendido por linha regular de transporte coletivo e, como não havia transporte fornecido pelos empregadores, “os trabalhadores não tinham outra alternativa a não ser consumir os produtos vendidos na cantina, pois não possuíam meios de ir até outro estabelecimento comercial, possuindo dificuldades até mesmo de sacar os respectivos salários em razão da distância entre o alojamento e a cidade mais próxima e o excesso de horas trabalhadas”, relata a denúncia. As vendas eram anotadas em um caderno, impondo aos trabalhadores um endividamento crescente e ilegal.
Nas frentes de trabalho do corte de cana-de-açúcar, os trabalhadores faziam suas refeições no meio do canavial e sob o sol, sentados no chão ou sobre as garrafas térmicas, com as marmitas na mão, sem passar por qualquer higienização pessoal.
Os acusados também não forneciam roupas, nem equipamentos adequados para o trabalho, além de deixarem as vítimas expostas aos riscos de contaminação pelos agrotóxicos utilizados na lavoura da cana.
Os fiscais ainda autuaram as empresas por impor a alguns trabalhadores jornadas exaustivas, extrapolando o limite legal de duas horas extras por dia, com trabalhos inclusive aos domingos.
Além dos empresários, o MPF denunciou quatro aliciadores: Denilson Eliel Paterno Braga, Ricardo Moretti, João Custódio e Givanildo José da Silva. Esses “gatos” eram responsáveis pela administração dos alojamentos e pela fiscalização, vigilância e transporte dos empregados.
Um encarregado de mão-de-obra da empresa Alvorada do Bebedouro, José Realista da Silva, também foi denunciado, assim como Romildo Machado de Figueiredo, encarregado das anotações na chamada Cantina do Tião.
Os réus irão responder pelos crimes de trabalho escravo (artigo 149), frustração de direito assegurado por legislação trabalhista (artigo 203), aliciamento de trabalhadores de um local a outro do território nacional (artigo 207) e formação de quadrilha (artigo 228), todos do Código Penal.
As penas, somadas, variam de 5 a 16 anos de prisão. (Com o MPF em Minas Gerais/MST)
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