Governo israelense quer alimentar à força prisioneiros palestinos em greve de fome
Khader Adnan estava em greve de fome há 55 dias e foi libertado na última segunda-feira (29/06) Efe
Guila Flint , de Tel Aviv (*)
Para ministro de Segurança Publica, greve de fome é "atentado suicida" contra Israel; "não permitiremos que os prisioneiros morram em nossas cadeias", disse
Israel quer permitir que autoridades penitenciárias alimentem à força prisioneiros em greve de fome. A lei já foi aprovada pela comissão legislativa do governo e será apresentada ao Parlamento.
Para o governo de Israel, a possibilidade de que um prisioneiro palestino morra na prisão em consequência da greve de fome representa um risco à imagem do Estado no exterior.
Segundo o ministro de Segurança Publica, Gilad Erdan, a greve de fome dos prisioneiros palestinos é um "atentado suicida" contra Israel. "Não permitiremos que os prisioneiros morram em nossas cadeias", afirmou o ministro, membro do partido governista Likud.
Vale lembrar que o único lugar no mundo ocidental em que a prática da alimentação forçada foi aplicada nos últimos anos é a prisão de Guantánamo.
Leonid Edelman, presidente da Federação dos Médicos de Israel, declarou que os médicos locais não vão cumprir a lei e que continuarão agindo de acordo com a ética médica, que proíbe explicitamente a alimentação forçada.
Em carta ao ministro Erdan, Edelman afirmou que "não poderemos colaborar com uma lei que contradiz totalmente nossas obrigações profissionais e éticas".
Em resposta, o ministro disse que "nós acharemos médicos que estarão dispostos a colaborar".
O ex-presidente da comissão de Ética da Federação dos Médicos, Avinoam Reches, declarou que "greve de fome é um ato politico e não um problema médico, portanto o Estado não pode empurrar esse problema para os médicos.
Convenções internacionais proíbem os médicos de colaborarem com alimentação forçada dos grevistas, pois se trata de uma forma de tortura. Espero que nenhum médico do nosso sistema público colabore com essa decisão e, se alguém o fizer, será julgado por nosso tribunal. Eu pretendo violar essa lei, prefiro ser preso".
Gansos não, prisioneiros palestinos sim
A lei em Israel proíbe a alimentação forçada de gansos (para a produção da iguaria foie gras), que é considerada desumana.
Reches, que é um neurologista renomado do Hospital Hadassa e professor da Universidade Hebraica, questiona: "então essa prática é desumana em relação aos gansos, mas pode ser aplicada contra seres humanos?", e explica que o procedimento é praticamente o mesmo nos dois casos, pois se introduz um tubo pelo nariz ou pela boca, que leva o alimento diretamente ao estômago. Isso causa grande sofrimento e risco de morte se a pessoa tenta resistir ao "tratamento", pois o alimento pode se desviar para o pulmão e o "paciente" pode morrer sufocado.
À beira da morte
Na manhã desta segunda-feira (29/06), as autoridades israelenses finalmente concordaram em libertar o prisioneiro palestino Khader Adnan, depois de 55 dias de greve de fome e no momento em que os médicos avaliaram que a morte dele era "iminente".
Adnan ficou algemado a uma cama no hospital Assaf Harofeh, ao sul de Tel Aviv, durante três semanas. Ele começou a greve de fome no dia 6 de maio e também se negou a receber suplementos de vitaminas e minerais, só tomando água durante todo o período da greve.
O prisioneiro exigiu ser libertado ou julgado, após ser detido, há um ano, segundo o dispositivo da "prisão administrativa", sequela das leis marciais do Mandato Britânico na Palestina, que permite que as autoridades prendam pessoas sem levá-las a um tribunal e mesmo sem informá-las quais são as acusações contra elas, por tempo indeterminado e por "razões de segurança".
Atualmente existem cerca de 400 prisioneiros palestinos em cadeias israelenses sob o dispositivo de prisão administrativa.
Khader Adnan, identificado com o grupo Jihad Islâmico na Cisjordânia, tem 37 anos e já foi preso 10 vezes sob o dispositivo da prisão administrativa. Na última vez, em 2012, ele fez uma greve de fome de 66 dias e acabou sendo libertado. Ao todo, Adnan já passou seis anos de sua vida em cadeias israelenses, sob prisão administrativa.
O grupo israelense Médicos pelos Direitos Humanos exigiu a libertação imediata de Adnan e advertiu que ele corria serio risco de morte. Segundo o grupo, em sua condição atual, e após perder mais de 20 quilos, ele não constituía perigo algum e estar algemado à cama não passa de tortura e humilhação.
Após o anuncio do acordo de libertação, Adnan concordou em começar a tomar soro e deverá ficar mais duas semanas no hospital para que possa voltar a se alimentar gradualmente.
Quando o Parlamento israelense aprovar a lei da alimentação forçada, prisioneiros como Adnan poderão ser submetidos a essa prática em vez de serem libertados.
(*) Guila Flint cobre o Oriente Medio para a imprensa brasileira há 20 anos e é autora do livro 'Miragem de Paz', da editora Civilização Brasileira. (Com Opera Mundi)
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