MST toma fazenda

No Brasil, jornalista documenta a
tomada de mais uma fazenda pelo MST

17.01.2011

Antonio Carlos Lacerda (*)

PRAVDA.RU

Segundo o jornalista José Maria Tomazela, do Estadão, a ação de tomada da fazenda Guarani, no Pontal da Paranapanema, em Presidente Bernardes, extremo Oeste do Estado de São Paulo, aconteceu às 7h50 deste domingo (16/01/2011) por integrantes do Movimento dos Sem Terras (MST) em um comboio com 50 pessoas em 16 veículos (carros, motos e kombis) com bandeiras vermelhas hasteadas, que avançou pasto adentro e ocupou pontos estratégicos da propriedade.
Só na primeira quinzena deste mês de janeiro 34 propriedades rurais e três repartições públicas já foram ocupadas pelos integrantes do MST liderados por José Rainha Junior para cobrar do governo federal uma reforma agrária.
Segundo relatou o jornalista que acompanhou a tomada da fazenda, o capataz da Guarani, Carlos Eduardo dos Santos, de 30 anos, estava no curral ordenhando uma vaca girolanda quando avistou o comboio de carros, motos e kombis avançando pasto adentro.
Ao ver as tradicionais bandeiras vermelhas içadas sobre os carros, Carlos Eduardo dos Santos interrompeu rapidamente o serviço, pegou o balde de leite e gritou para a esposa: "Bem, ligue para o patrão e avise que o MST está aí de novo."
O comboio do MST com 16 veículos e 50 pessoas partiu do acampamento Zé Maria, pegou a Rodovia SP-563 e se deslocou até a porteira da fazenda Guarani, onde os sem-terra arrebentaram o cadeado para dar passagem aos veículos.
Dois quilômetros à frente, sob algumas árvores, o comboio parou e tudo o que havia dentro e sobre os carros - bambus, arames, lonas, colchões, panelas, garrafas PET e até barracas de montar - foi posto sobre a vegetação.
Um grupo de sem terras muniu-se de enxadões e cavadeiras e começou a montar os barracos, enquanto um outro improvisou um fogão para preparar a comida. O gado, assustado, correu para o outro lado do pasto.
O coordenador Cícero Bezerra de Lima começou a distribuir tarefas, e disse que a fazenda tem cerca de 500 hectares e já foi considerada devoluta pela Justiça. "Está em processo de desapropriação, mas a demora é grande. Dá para assentar umas 30 famílias aqui", disse.
O sem-terra Hélio de Souza, de 60 anos, e sua mulher Maurize, de 58, ergueram um barraco de lona preta sobre uma estrutura de bambus. Hélio disse que ele e sua mulher vivem em acampamentos desde março de 2003. "A gente não conseguia mais pagar aluguel", relatou.
As irmãs Elisângela Júlio dos Santos, de 27 anos, e Juliana, de 21, foram incumbidas de vigiar a porteira. Esse fato é uma inovação nas invasões do MST, já que a tarefa era confiada a homens de aparência truculenta. "É a vez das mulheres, não vê a Dilma presidente?", justificou Juliana, sem-terra que já fez curso de modelo.
Elisângela conta que os pais moram há 14 anos perto da fazenda Guarani, no assentamento São Jorge. Na mesma casa, além do casal, moram seis filhos adultos e oito crianças. "Quatro são meus filhos e agora estamos lutando para termos o nosso cantinho."
Uma hora depois da invasão, duas viaturas da Polícia Militar do Estado de São Paulo chegaram à fazenda Guarani. Os policiais anotaram as placas dos veículos dos sem terras, pediram que eles mostrassem seus documentos, o que não aconteceu, sob a alegação de que não os tinha no momento. Os nomes que os sem terras forneceram foram anotados.
O capataz da fazenda Guarani, Carlos Eduardo dos Santos, disse que, para o dono da propriedade, Nilson Rigas Vitalle, já tinha virado rotina registrar boletim de ocorrência e entrar na Justiça com pedido de reintegração de posse.
"Estou aqui há 11 anos e perdi a conta de quantas invasões foram, sei que mais de dez", disse Carlos Eduardo dos Santos. Mesmo assim, segundo ele, a fazenda continua produtiva. "São 800 bois em engorda."
Carlos Eduardo dos Santos disse que, em algumas ocasiões, os sem-terra foram violentos e fizeram estrago, mas não quis dar detalhes. "À noite, quem fica aqui com eles sou eu e minha família."
Enquanto isso, o líder dos sem terras, José Rainha disse ter mobilizado mais de 5.000 pessoas para a onda de invasões. Pela sua contabilidade, em oito das 31 áreas, os sem-terra acamparam do lado de fora, sem consumar a invasão, o que teria ocorrido na vicinal de acesso à usina Alcídia, do grupo ETH, em Teodoro Sampaio.
Era ali que as amigas Rosineide do Espírito Santo, de 40 anos, e Cláudia Rodrigues Oliveira, de 35, iniciavam sua vida de sem-terra. Elas trabalham como faxineiras na cidade e diaristas no campo e querem um lote para melhorar de vida.
"Depois que foi assentada, minha irmã passou a ter tanta fartura que até tem condições de hospedar um parente que chega", disse Rosineide, exibindo uma camisa com o nome do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "Eu votei na (Dilma) Rousseff", disse, sobre a nova presidente.
O líder dos sem terras, José Rainha, quer que o governo federal assente 8 mil famílias em áreas que a Justiça já considerou devolutas, e que pode chegar a 200 mil hectares.
José Rainha turbinou o "janeiro quente" com uma onda de invasões no oeste do Estado de São Paulo e reclama que a justiça só é rápida "para um lado".
Sobre qual o objetivo das ações do "janeiro quente", José Rainha disse que só a base do grupo dele, que inclui os movimentos aliados, tem 8.000 famílias cadastradas no Incra à espera de um lote, muitas delas acampadas há seis, sete anos.
Enquanto isso, segundo Rainha, tem terras devolutas que, somadas, chegam a 200 mil hectares. "São os 92 mil do 15º Perímetro que o Superior Tribunal de Justiça já julgou e as terras de outros dois perímetros que serão julgadas agora", enfatizou José Rainha.
Rainha disse não ter dúvida de que a Justiça também vai reconhecê-las como terras públicas, e recomendou que os governos estadual e federal se entendam e antecipem a obtenção dessas terras, que pode ser através de acordo com o fazendeiro. Rainha disse, também que, "No caso das usinas que estão sobre as áreas, não sou a favor de fechar uma usina que gera emprego e renda, mas os empresários podem comprar outra área e destinar para a reforma agrária".
Questionado sobre o que pode ser feito para resolver esses conflitos na região, José Rainha disse que seria arrecadar terras, mas isso "depende do governo e da Justiça".
Ele disse que o governo estadual precisa acelerar a arrecadação das terras públicas, e o federal precisa rever os índices de produtividade, pois com os atuais não se arrecada nada, e mudar a lei para pagar em dinheiro pelas benfeitorias.
"A Justiça também precisa ser mais rápida. Hoje, ela é rápida só para um lado. Veja que, mesmo no fim de semana, alguns juízes já deram liminar para despejar os sem-terra. Se a Justiça for sempre rápida assim, parabéns", concluiu José Rainha.
A União Democrática Ruralista (UDR) culpou o governo federal pelas ações de invasão de terras no Pontal do Paranapanema, no extremo Oeste do Estado de São Paulo, disse que a reforma agrária virou uma forma de ganhar dinheiro e que o MST está à procura de um mártir.
Para o presidente da UDR, Luiz Antonio Nabhan Garcia, os números divulgados pelo MST estão superfaturados. "Tem fazenda que eles disseram ter invadido, mas o dono me disse que ninguém entrou, nem está acampado." Para Rainha, há casos em que o proprietário demora a ficar sabendo da invasão. "Muitos estão na praia, de férias."
Para Nabhan Garcia, as invasões na região do Pontal do Paranapanema são "crimes anunciados". Ele culpa o governo federal por incentivar indiretamente as ações do MST e o estadual por questionar na justiça a legitimidade da posse dos produtores rurais que colonizaram a região.
Sobre a reação dos fazendeiros quanto às invasões de suas terras, Nabhan Garcia disse que eles estão orientados para agir dentro da lei, pedindo na justiça a reintegração de posse imediata e a identificação dos invasores.
"Pedimos a eles que não reajam, não façam nada, pois o MST está em busca de um mártir. Agora, essas invasões são um crime anunciado e premeditado. O líder deles avisou que faria e nenhuma autoridade se movimentou para impedir", enfatizou o presidente da UDR.
"A impunidade é que gera essa situação. O governo federal apóia esses grupos, abre os cofres. A reforma agrária virou uma maneira de ganhar dinheiro, basta ver quantas cooperativas do MST estão envolvidas em desvios", revelou Nabhan Garcia.
Sobre uma fórmula para acabar com esses conflitos, o presidente da UDR disse que o governo do Estado "teria de parar com essa história de dizer que as terras aqui são devolutas. Tira a terra do produtor que trabalha nela há 150 anos e entrega para quem não produz".
O líder ruralista disse ser inaceitável expulsar quem comprou, pagou os impostos e está produzindo e entregar para foras da lei. "Nas terras que eles dizem ser devolutas tem usinas, resultado de um investimento de R$ 3 bilhões, que geram 10 mil empregos diretos e indiretos na região. Vão tirar as usinas também?

(*)Antonio Carlos Lacerda é Correspondente Internacional do PRAVDA.RU no Brasil.
E-mail:- jornalistadobrasil@hotmail.com

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