Direitos Humanos
Campanha denuncia ameaças contra defensores e defensoras de direitos humanos
Marcela Belchior
Adital
O ativista Renato Souto , 38 anos, é integrante do Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH) no Estado do Amazonas e, há anos, lida com a condição de que, para buscar justiça aos direitos fundamentais dos cidadãos/ãs, é necessário se interpor ao controle de quem está no poder institucional e econômico.
Ele é um dos representantes da campanha "Somos Todxs Defensorxs”, que dá visibilidade a casos de criminalização de defensoras e defensores de direitos humanos no Brasil desde o início deste ano e pretende reforçar a discussão sobre o tema em todo o país.
A campanha é uma realização conjunta das organizações Dhesca Brasil - Plataforma de Direitos Humanos, Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais; Justiça Global – Brasil; Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social; e do Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), com apoio do Fundo Brasil de Direitos Humanos e de vídeos produzidos pelo coletivo midiativista Nigéria.
Em vídeo de campanha, disponível na Internet, Souto conta que, de 62 municípios do Amazonas, estado localizado na região Norte do Brasil, o MNDH já recebeu denúncias de exploração sexual e pedofilia em 52 deles. Em todos os casos, relata, há envolvimento do gestor municipal, vereadores, comerciantes, deputados, representantes do Poder Judiciário, policiais e, até mesmo, de conselheiros tutelares, estes que têm o papel de porta-vozes das comunidades para assegurar os direitos de crianças e adolescentes junto a órgãos e entidades.
"Quando nós denunciamos uns desses gestores, nós somos violentados, ameaçados de morte”, afirma o ativista, em depoimento para a campanha. Segundo ele, a primeira ameaça que sofreu foi em 2012. "Eu recebi uma coroa de flores com um bilhetinho: se eu não saísse desses casos, a próxima coroa iria para o meu caixão. Foi no dia 27 de agosto de 2012”, diz ele, que nasceu em Brasília e vive no Amazonas desde 2007.
"Na segunda ameaça, ele já passou ao número da placa do carro que eu tinha, o caminho que eu percorria, pediu para eu me afastar da minha namorada (porque poderia acontecer alguma coisa com a minha namorada). Ele sabia quem era minha namorada, os filhos dela, por onde eu passava e tudo”, relata. "Depois, nas outras ameaças, foi tudo ou nada. Se eu não cuidar da minha proteção pessoal, não é o Poder Judiciário do Amazonas que vai determinar minha proteção. Não é a polícia do Amazonas que vai me proteger. Então, na verdade, a nossa cabeça é ‘a prêmio’”, destaca Renato.
De acordo com o ativista, atualmente, uma rede de aliciamento e exploração sexual infantil na região é sustentada com dinheiro público, estendendo-se pelas cidades de Manaus, Parintins, Barreirinha, Autazes, Barcelos e São Gabriel da Cachoeira, envolvendo agentes públicos e autoridades de outras localidades. "É um trabalho muito difícil, muito árduo, mas a gente não desiste, porque, como costumo dizer, na mão desses poderes está o sangue dessas crianças que foram violentadas. E nas mãos dos direitos humanos estão as lágrimas e a esperança dessas crianças”, conclui o defensor.
Ações da campanha
Além do depoimento de Renato Souto, outros dois defensores figuram em mais dois vídeos da campanha: Claudia Favaro, defensora do direito à cidade e à moradia adequada, que integra a Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa (Ancop); e Marinalva Santana, defensora da equidade de direitos para todos e todas independente da identidade de gênero ou da orientação sexual. Ao todo, deverão ser produzidos nove vídeos com o testemunho de mulheres e homens que atuam na defesa dos direitos humanos no país. O objetivo é que o material circule por instituições sociais, de ensino, pelas redes sociais da Internet e outros espaços de discussão.
Em entrevista à Adital, Melisanda Trentin, membro da coordenação colegiada da Justiça Global, explica que o objetivo é pautar a sociedade brasileira para o tema de proteção aos defensores e defensoras. "Vivemos no Brasil um contexto de muitas violações aos defensores e defensoras. É preciso trazer a público essas lutas, porque a sociedade ainda não tem uma visão de quem são essas pessoas e do trabalho que fazem”, afirma.
Com a difusão dos depoimentos, a expectativa é influenciar as políticas públicas de proteção aos defensores/as de direitos humanos. "A gente entende que o Estado tem obrigação de proteger essas pessoas. A retirada delas de seu território de atuação acarreta na desmobilização das lutas”, enfatiza Melisanda.
Além da difusão dos casos, a campanha deverá participar de Audiência Pública, ainda neste mês de setembro, com Ideli Salvatti, ministra da Secretaria Especial de Direitos Humanos do Brasil, para discutir caminhos para o setor. A campanha foi iniciada no início de 2014 e não tem prazo para encerrar.(Com a Adital)
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