Cem anos de Maurício Grabois


                                                
Maurício Grabois, presente!

Há 32 anos morria em combate no campo de batalha da luta de classes, na luta contra a ditadura militar, o dirigente comunista Maurício Grabois, provavelmente no dia 25 de dezembro de 1973. À época, aos 61 anos, era o comandante das "Forças Guerrilheiras do Araguaia", organizadas pelo Partido Comunista do Brasil.

Grabois foi um dos mais destacados dirigentes comunistas que a luta do povo brasileiro forjou no século passado. Teve uma longa trajetória de integridade, coragem e liderança política consagrada à luta revolucionária contra a miséria, a opressão, pela liberdade e pelo socialismo.

Nascido em 2 de dezembro de 1912, em Salvador (BA), Maurício Grabois ingressou no Partido Comunista do Brasil – PCB, em 1930 após mudar-se para o Rio de Janeiro. Entrou para a escola Militar de Realengo em 1931, mas não terminou o curso, pois dela foi expulso. Posteriormente, em 1933, cursou a Escola de Agronomia, porém dois anos depois deixou os estudos para dedicar-se exclusivamente à luta política revolucionária. Tornou-se responsável pelo setor de agitação e propaganda da Juventude Comunista do Brasil, em 1934. Participou ativamente da formação da frente antifascista, Aliança Nacional Libertadora (ANL), que culminou nos levantes de novembro de 1935.

Em 1940, no Estado Novo, período de repressão e perseguição aos comunistas, foi condenado à revelia, sendo preso em 1941. Conquistou a liberdade em 1942, e com outros camaradas participou da reorganização do PCB rebatendo as teses liquidacionistas do Partido, com a formação de sua Comissão Nacional de Organização Provisória (CNOP), tornando-se um dos seus dirigentes nacionais.

Em 1945, com a vitória da URSS e das forças aliadas sobre o nazi-fascismo, abriu-se no mundo uma nova conjuntura da luta popular e revolucionária. Nesse momento, os comunistas são reconhecidos por seu destacado papel na derrota do nazi-fascismo com repercussão em seu trabalho político, e na ampliação do número de militantes. No Brasil, finda o Estado Novo e o PCB passa para a legalidade. Nas eleições de 1945 para a Assembléia Constituinte, o Partido elegeu um senador (Luiz Carlos Prestes) e catorze deputados, entre eles, Maurício Grabois, que foi escolhido o líder da bancada comunista.

Mas o período de legalidade do PCB foi curto e já em início de 1948 seus integrantes tiveram seus mandatos cassados. Com novas perseguições, Grabois e vários camaradas passaram a atuar na clandestinidade. No início e meados da década de 1950, além da luta vitoriosa pelo petróleo, ocorreram várias greves nas cidades e lutas camponesas armadas, onde o Partido teve papel dirigente.

A partir de 1956, na reunião do XX Congresso, o Partido Comunista da União Soviética derivou um conjunto de resoluções que marcaram o movimento comunista internacional, na guinada à direita do PCUS, com ênfase para a defesa da via pacífica para o socialismo, o abandono do conceito marxista de ditadura do proletariado (substituído por “Estado de todo o povo”) e pelos ataques a Stalin.

Em 1962, Maurício Grabois e outros dirigentes, entre eles Pedro Pomar, João Amazonas, Diógenes Arruda, Carlos Danielli, fazem uma avaliação crítica das posições reformistas e revisionistas que o PCB, particularmente após o XX Congresso do Partido Comunista da União Soviética, passava a defender e decidem refundar o PC do Brasil.

Em 1º. de abril de 1964 um golpe militar derrubou o governo de João Goulart e novo período de repressão política se inicia com a ditadura. Grabois passa novamente a viver na clandestinidade. Em 27/10/1965 teve seus direitos políticos cassados pelo Ato Institucional nº. 2 e foi condenado em vários processos à prisão.

Outros dirigentes criticam as posições reformistas e pacifistas do PCB e deixam o Partido. Algumas organizações revolucionárias se formam com o objetivo de realizar um enfrentamento armado contra a ditadura militar. Nesse período, Grabois contribuiu nas formulações teóricas do PC do B e na estratégia de “guerra popular prolongada” no Brasil. O PC do B desloca dezenas de militantes para o interior do país, na tentativa de organizar a luta armada guerrilheira na região do Araguaia. Grabois é destacado pelo PC do B para dirigir a Comissão Militar e comandar as forças guerrilheiras e transferido para a região em 1967.

O movimento é detectado pelo aparelho repressivo da ditadura que realiza uma primeira campanha militar, em abril de 1972, contra os militantes do PCdoB no sul do Pará, mas não consegue derrotá-los. Intensifica-se a violência na região, com enorme aparato de bombas, helicópteros e aviões contra as "Forças Guerrilheiras do Araguaia". Todo tipo de barbárie, torturas e assassinatos são praticados contra os guerrilheiros comunistas e os camponeses. Mas somente na terceira campanha iniciada em outubro de 1973, com o deslocamento de milhares de soldados, com um trabalho de infiltração e “inteligência”, o Exército e demais forças repressivas da ditadura conseguiriam derrotar a guerrilha em meados de 1974.

Maurício Grabois caiu em combate em 25 de dezembro de 1973. Ele e todos os guerrilheiros que morreram no Araguaia integram a lista de desaparecidos políticos da ditadura militar que, com uma exceção, não tiveram seus corpos resgatados para serem enterrados por seus familiares. Morreram em combate, executados ou assassinados sob brutais torturas.

São heróis de nosso povo, de sua luta contra a miséria e a opressão do sistema capitalista. Militantes que deram o melhor de si para essa luta. Deram, inclusive, suas próprias vidas. Mantiveram uma atitude de dignidade e bravura diante de seus carrascos, honraram a condição de serem revolucionários comunistas.

Em que pesem as dificuldades encontradas e os erros cometidos, a história de luta do povo brasileiro foi generosamente enriquecida pela marca de dedicação, bravura e desprendimento daqueles homens e mulheres. Período da história brasileira com uma rica experiência de luta que merece um profundo balanço político, ainda a ser realizado.

* * *

E quem garante que a História
É carroça abandonada
Numa beira de estrada
Ou numa estação inglória?

A História é um carro alegre
Cheio de um povo contente
Que atropela indiferente
Todo aquele que a negue

É um trem riscando trilhos
Abrindo novos espaços
Acenando muitos braços
Balançando nossos filhos

Lo que brilla con luz propia
Nadie lo puede apagar
Su brillo puede alcanzar
La oscuridad de otras costas

Quem vai impedir que a chama
Saia iluminando o cenário
Saia incendiando o plenário
Saia inventando outra trama?

Quem vai evitar que os ventos
Batam portas mal fechadas
Revirem terras mal socadas
E espalhem nossos lamentos?

E enfim quem paga o pesar
Do tempo que se gastou
De las vidas que costó
De las que puede costar?

Já foi lançada uma estrela
Pra quem souber enxergar
Pra quem quiser alcançar
E andar abraçado nela

Já foi lançada uma estrela
Pra quem souber enxergar
Pra quem quiser alcançar
E andar abraçado nela

[Canción por unidad latinoamericana]
(Pablo Milanés/Chico Buarque)

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