Jornalistas em tempos de covid-19


                                                                             
        Redação da A Gazeta, de Vitória, em tempos de covid-19: distância segura entre os profissionais (Imagem: A Gazeta)

Claudia Sanches

Pesquisa recente do Instituto Datafolha aponta o jornalismo como fonte mais confiável nesse momento da crise do novo coronavírus. TVs e jornais lideram, com 61% e 56%, respectivamente, o índice de confiança em informações divulgadas sobre a pandemia. Programas jornalísticos de rádio e sites de notícias, com 50% e 38%, vêm na sequência.

Nesse momento em que o exercício da profissão é um serviço fundamental, os profissionais de imprensa se adaptam ao cenário atual. Com a carga de trabalho aumentada, enfrentam  ameaças de redução salarial, demissões, além do risco de contração do vírus. As Medidas Provisórias 927 e 936 permitem redução dos salários em até 70%.

No estado do Rio de Janeiro, sabe-se que vários jornalistas já contraíram a virose. Na segunda-feira (13/04), o jornalista do SBT José Augusto Nascimento, 57 anos, morreu contaminado pelo coronavírus. Estimou-se que dos 75 profissionais que trabalham na empresa, 35 estivessem infectados. A sede da emissora, no bairro de São Cristóvão, está em condições precárias e propícias à propagação do vírus. 

O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro (Sindijor)  entrou com ações junto ao Ministério Público do Trabalho (MPT) contra o  sistema SBT, que mantém seus trabalhadores em ambiente totalmente insalubre, a fim de  interditar o prédio e transferir a redação para outro local.
                                                                     


A presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Maria José Braga(imagem), afirma que as empresas jornalísticas  estão se aproveitando do momento para reduzir os direitos dos trabalhadores. A Fenaj se posiciona contra as medidas promovidas pelo governo de redução salarial.

“Em países como Portugal e Argentina, por exemplo, os governos estão preservando os empregos assumindo parte de despesas dos salários dos trabalhadores. Estamos orientando os sindicatos para que os profissionais não assinem negociações individuais. O patrão chega com a proposta, na maioria das vezes, o empregado é obrigado a aceitar. Acionem o sindicato quando houver proposta de redução salarial”, diz ela.

Segundo Maria José, em Minas Gerais, no jornal O Tempo, e no Ceará, no jornal O Povo, já houve demissões em massa. No jornal cearense, os desligamentos chegam a 90 profissionais e não estão recebendo verbas rescisórias.

A presidente da Fenaj acrescenta que o ideal é que os profissionais sejam colocados em home office. Em redações de rádio e TV, parte da equipe pode fazer trabalho remoto, outra parte não. De qualquer forma, segundo ela, o jornalista está sobrecarregado, em função da pandemia. “A carga e horários de trabalho aumentaram, por isso não faz sentido se falar em redução salarial”, ressalta ela.

A entidade exige que os empregadores adotem medidas necessárias para garantir as condições de segurança para os jornalistas. As redações devem manter uma distância segura entre os profissionais; as empresas devem oferecer equipamentos, como dois microfones para as equipes de reportagem, insumos como álcool em gel, luvas e máscaras. “Esperamos que essas medidas estejam sendo cumpridas”, enfatiza.

Maria José  destacou que o trabalho do jornalista é essencial neste momento: “Ele está cumprindo a tarefa de informar e educar a população. Garantir a informação verdadeira,apurada de fonte segura, para fazer o contraponto ao que circula nas redes sociais. O jornalista surge como fundamental para que a população possa ser informada e alertada das mentiras que desinformam a população”.

A dirigente  lembra que o Centro de Pesquisa em Comunicação e Trabalho, da Universidade de São Paulo (USP), lançou estudo para avaliar o impacto do coronavírus no trabalho da categoria. O questionário da pesquisa está no site da Escola de Comunicação e Artes, da USP, e seu resultado será divulgado para sindicatos e associações para elaboração de políticas públicas. A Fenaj  acredita que o estudo vai dar um panorama mais preciso, com dados mais seguros, sobre a realidade.


Denúncias e orientações no Rio de Janeiro

A presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro, Carmen Pereira,  já tem um retorno sobre a situação de profissionais que trabalham internamente, nas redações, ou externamente, na rua, e freelancers que estão solicitando orientações do sindicato. Segundo ela, após terem seus salários e outros benefícios cortados pelas empresas, vários jornalistas têm procurado o sindicato por e-mail sindicato-rio@jornalistas.org.br e pelo celular (21) 99278-2137 (whatsApp).

Carmen observa que “de maneira geral, as empresas fazem propaganda de que jornalismo é atividade essencial, mas tratam seus trabalhadores como se ainda fossem senhores escravocratas”. O jornal O Dia, por exemplo, na edição de 03 de abril divulgou que “o número total de usuários do portal mais do que dobrou em relação ao período anterior”. 

O jornal reconheceu que “os jornalistas estão trabalhando arduamente para manter a população bem informada nesse período tão delicado de nosso país. Mas a presidente do sindicato destaca que O Dia é uma das empresas que informou aos trabalhadores, em  30 de março,  que iria reduzir salários do mês de março, depois de terem trabalhado todo o período. Além disso, cortou vale alimentação e vale transporte, sem levar em consideração que a MP 936 diz explicitamente que não pode haver corte de benefícios.

Logo que o Estado do Rio entrou em quarentena, o sindicato enviou uma lista de orientações sobre como proteger a segurança e a saúde dos profissionais frente à Covid-19, tanto para os jornalistas como para as empresas. A maioria das empresas não deu retorno. As que deram, afirmaram que estavam cumprindo as determinações da Organização Mundial de Saúde (OMS), sem especificar quais delas.

As orientações transmitidas pelo sindicato são de afastar imediatamente os profissionais que integram grupos de risco, os responsáveis por crianças, e os idosos, passando a trabalhar em home office ou, simplesmente, liberá-los, mantendo a remuneração. Para os que permanecem nas redações e nas ruas, as orientações são fornecer  EPI (máscaras, luvas, álcool em gel e toalhas de papel).  Além disso, orienta-se que seja  suspenso o ponto biométrico e providenciada a higienização permanente de equipamentos, viaturas e prédios.

O sindicato enviou ofício para as empresas jornalísticas assim que começaram as denúncias sobre a grave situação do SBT. Mais recentemente enviou ofício também aos sindicatos patronais de radiodifusão e mídia impressa, cobrando a adoção imediata de medidas de proteção à saúde dos profissionais de comunicação.

Também recorreu ao MPT  contra o jornal O Dia, por reduzir salários antes mesmo da vigência da MP 936 e por não  pagar os vales de alimentação e transportes,  apesar de descontar a parte dos  trabalhadores. O Dia retrocedeu e pagou os vales, alegando que os valores foram  descontados indevidamente do salário de março, e que  serão ressarcidos posteriormente.

O sindicato ainda não tem números oficiais da quantidade de jornalistas contaminados pelo coronavírus. Especula-se, no entanto,  que sejam mais de 70 no município do Rio.  “Solicitamos aos sindicatos patronais que nos enviem uma relação dos afastados por coronavírus. O sindicato entende que jornalismo é atividade essencial. 

Isso significa respeitar as normas de proteção já elencadas acima e dar todo apoio (financeiro, assistencial e psicológico) aos vitimados. Ao mesmo tempo, as empresas devem custear os testes e contraprovas, já que a saúde e a segurança dos jornalistas no exercício profissional é responsabilidade das empresas”, afirma Carmen.

O sindicato está realizando enquete sobre as condições de trabalho dos profissionais de imprensa, sobre  quem está em home office e quem continua nas redações. O jornalista pode acessar o link e responder a enquete.

https://m.facebook.com/story.php?story_fbid=1613305718818243&id=179955152153314

Em São Paulo, sindicato rejeita propostas dos sindicatos patronais

Na capital do estado de São Paulo, jornalistas de jornais e revistas rejeitaram, em reunião virtual realizada nesta quarta-feira (15), a proposta patronal de firmar um aditivo à Convenção Coletiva em vigor que permita às empresas aplicar as medidas das MPs 927 e 936. 

Cerca de 350 jornalistas participaram das quatro assembleias e rejeitaram o aditivo proposto pelo Sindicato Patronal. A proposta patronal ainda inclui suspensão da multa por atraso no pagamento dos salários e o valor pago a título de Participação nos Lucros e Resultados (PLR).

A categoria aprovou uma contraproposta para que as empresas que quiserem adotar mecanismos previstos nas MPs 927 e 936 procurem o Sindicato dos Jornalistas para abrir negociação sindical com possibilidade de Acordo Coletivo.

A contraproposta dos jornalistas prevê ainda que estas empresas devem apresentar minuta de Acordo Coletivo com todas as especificações, incluindo a lista de trabalhadores atingidos e seus contatos, com impedimento de dispensa sem justa causa durante o prazo de vigência do aditivo e prorrogação da atual Convenção Coletiva para 31 de agosto de 2020.

O presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo (SJSP), Paulo Zocchi, também orienta os profissionais a entrar em contato com o sindicato imediatamente caso seu empregador apresente proposta de acordo individual.

http://www.abi.org.br/jornalistas-em-tempos-de-covid-19/

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