Desfile de vaidades pela janela

  


 Carlos Lúcio Gontijo



       A cultura que sempre recebeu poucos recursos dos governantes é o primeiro setor atingido nos momentos de crise, vivenciando a mesma situação das classes menos favorecidas brasileiras, que nada têm, mas, com a chegada das chuvas, costumam perder tudo!

    Na estrada da edição de livro desde 1977, podemos afirmar que o livro está para o autor como a semente para a lavoura. Ou seja, sem passar pelo processo de impressão a obra não existe nem tem colheita; pois não vem à luz. Ademais, é por intermédio da edição que os autores podem dimensionar o valor de seu trabalho, ao serem lidos por alguém além de si mesmos.

   Dizia Platão (filósofo grego, 427 a.C.), que se um livro for lido por pelo menos outra pessoa além do próprio autor já estará justificada a labuta intelectual despendida em sua elaboração. Ou seja, naquele tempo já se vislumbrava a realidade de os leitores não serem muitos, ficando a propagação do conteúdo dos livros na mão de mentes tocadas pela divina busca de conhecimento e sensibilização do espírito através da arte da palavra escrita.

  Assistimos hoje a uma colossal supremacia da imagem sobre a palavra, como se tivéssemos voltado ao tempo da comunicação à base de desenhos na parede das cavernas. Todavia, apesar dos pesares, ainda vale o que está escrito e os livros continuam tendo um grande significado para a humanidade.

  Nossa experiência de autor de 18 livros, alguns deles com segundas edições, nos leva a afirmar que a dificuldade de imprimir obras literárias no Brasil inibe o desenvolvimento de muitos escritores e poetas, que ficam tão prisioneiros quanto seus originais encarcerados nas gavetas, como se vivêssemos em regime de cruel censura ditatorial.

   Os custos em torno da edição de um livro são bastante elevados, mesmo com o governo abrindo mão da cobrança de impostos. Para jogarmos clarões sobre o imbróglio, os autores independentes arcam com o pagamento da impressão de seus livros e, quando doam seus livros a escolas e bibliotecas, enviando-os pelo serviço de postagem dos Correios, não são contemplados com qualquer benefício, ou seja, são obrigados a enfrentar o ônus de todas as taxas, numa verdadeira punição a quem faz cultura no Brasil, atuando sob o vazio de governo na área.    

    Os que passam pela experiência da edição independente não se perdem na glamourização da atividade literária, pois entendem a gravidade do sacrifício que experimentam por não existir política cultural em nosso país. Este panorama lhes impõe uma procura de constante aprimoramento e, portanto, determinado afastamento dos convescotes e ‘caras e bocas’ culturais, que em muitos casos se lhes apresentam comandados por despreparados, a começar do convite: “Haverão muitas atrações...” Daí então, cientes de que o texto revela a mente, optam por lançar seus livros de quando em vez, voltar para casa e ficar observando o desfile de vaidades pela janela.

       Carlos Lúcio Gontijo

       Poeta, escritor e jornalista

      www.carlosluciogontijo.jor.br

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