Educação, jornais, livros e leitura




Carlos Lúcio Gontijo


Metidos na visão estreita do corte de custos, os proprietários de jornais resolveram extinguir o departamento de revisão, que na realidade funcionava como uma espécie de editoria final, livrando os jornais não apenas de muitos erros gramaticais e de grafia, mas também de muito equívoco de informação




Os índices de leitura são baixos e vão continuar baixos por muito tempo no Brasil, caso permaneçamos assentados sobre as mesmas estruturas pedagógicas. Nossos jornais, que deveriam usar a sua influência para exigir projeto educacional capaz de democratizar o ensino de boa qualidade e didaticamente montado sob o objetivo de atender, por meio de linguagem adequada, à totalidade de sua clientela, em vez de apenas 20% dela – o que explica o grande número de repetência e evasão escolar –, não lidam bem com o assunto e nem conseguem demonstrar na prática a sua preocupação educacional, apesar de serem hoje drasticamente prejudicados pela falta de hábito de leitura.
Metidos na visão estreita do corte de custos, os proprietários de jornais resolveram extinguir o departamento de revisão, que na realidade funcionava como uma espécie de editoria final, livrando os jornais não apenas de muitos erros gramaticais e de grafia, mas também de muito equívoco de informação. A esse procedimento podemos somar a arrogância dos jornais de se sentirem os donos da notícia, transformada por eles em marketing ou na simples decisão de divulgar ou não, baseados simplesmente no jogo comercial (e político) de seus interesses.
A grande verdade é que esse procedimento desprovido de compromisso com a boa informação vinha, há tempos, provocando queda no estoque de leitores, mas não era muito sentido no faturamento dos jornais, pois os anunciantes ainda viam neles a influência do passado. Daí então surgiu a internet tirando-lhes o monopólio da notícia, e eles, atravessando desmesurada crise de identidade, se nos apresentam despreparados para ser o contraponto, uma vez que a divulgação inserida nos espaços virtuais sofrem com a falta de credibilidade, cobrando do leitor o exercício da filtragem.
No desespero, muitos jornais optaram por se transformar em tablóide, no qual é confundida a leveza jornalística com exposição de mulheres nuas, falta de notícia e de opinião, dando origem a uma publicação que já chega às ruas velha, ultrapassada e sem qualquer atrativo. Em suma, uma vez nas bancas, os tablóides coloridos têm um período de procura e venda bastante curto, além de descartados como papel de embrulho no primeiro correr de olhos do leitor. Ou seja, não há neles matéria a ser revista (se a ideia era fazer um produto impresso absolutamente descartável, acertaram em cheio e não têm do que reclamar).
Dia 27 de março último, marcamos presença, em corpo e alma, no sepultamento do amigo Elias Maboub, que foi revisor por mais de 50 anos. Ele gostava de brincar conosco dizendo que “jornal sem revisão era a materialização do ato de fazer do erro a certeza do acerto...” E se julgam tão certos, saudoso Maboub, que agora querem jornalistas sem diploma; talvez estimulados pelo grande feito de elaborarem jornais tão descompromissados com o leitor que até podem, agora, se dar ao luxo de dispensar mão-de-obra técnica, ética e intelectualmente preparada para o exercício da profissão de jornalista.
Num ambiente assim contrário ao prazer da leitura e da reflexão tomado como fator prejudicial ao lazer propagado pela cultura de eventos, ousamos enviar um romance de 368 páginas (Jardim de Corpos) e um livro infantil (Duducha e o CD de Mortadela) para impressão, enfrentando os altos custos gráficos brasileiros, onde a crise econômica baixou o preço do quilo do papel e do papelão recolhidos pelo catador de material reciclável nas ruas, ao passo que o preço de edição de um livro se mantém em patamares elevadíssimos, apesar de o governo ter retirado todos os impostos que incidiam sobre a produção literária, que pouco espaço tem nos jornais, onde a preocupação é tão-somente com as celebridades e os famosos, ainda que, exaustos, enfastiados e entediados, nada tenham a dizer.

Carlos Lúcio Gontijo é jornalista, poeta, escritor, revisor e editor.
http://www.carlosluciogontijo.jor.br/

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