Um trem para Sobibor


Vinte dias, mais de 15 mil quilômetros percorridos de avião, de barco, de van e de táxis depois, volta. Com expectativa quanto ao segundo turno. A notícia pegou-me de surpresa ao acordar na manhã o dia 4 em Jerusalém. Surpresa por que mais uma vez ousei acreditar nas pesquisas, na antevéspera de deixar o Brasil . Nada diziam quanto ao desempenho de nosso candidato, Ivan Pinheiro...
Mas davam a vitória da legenda governista. Ignorando a terceira via, representada pela senadora Marina Silva. Quando liguei a TVE, ela transmitia a fala da ex-ministra Dilma, com o audio em português, a tradução em espanhol e legendas em hebraico. Coisas desse mundo globalizado...Logo depois falou Serra e apareceu o vídeo da Marina.
Era o segundo turno nos convocando para um novo balanço do sistema eleitoral, uma análise das forças políticas e de sua representação na atual etapa da revolução brasileira. Coisa para muitas horas de reflexão, discussões acaloradas e resoluções difíceis.
Mas quero falar de um trem para Sobibor, da ascensão e queda da Acrópole, da Ágora que ficou no passado, da esperança dos novos pescadores do Mar da Galiléia, dos garotos empunhando armas na Palestina e de um muro da vergonha de fazer corar os que verteram lágrimas quando caiu o de Berlim. Lágrimas de alegria, de esperança em um mundo mais igual para todos. Sem injustiças. Sem discriminações.
Quero berrar aos quatro ( por que somente quatro?) ventos que descobri o segredo de quatro, cinco mil anos: as pirâmides foram construídas para que neste século 21 deixemos de ser bestas e acreditar que reformas políticas, econômicas, eleitorais, vão mudar alguma coisa.
Não vão mudar nada! A continuar assim, daqui a mais cinco mil, dez mil anos, se não macharmos para o socialismo, para o comunismo, pirâmides de pedras e pirâmides sociais continuarão simplesmente as mesmas...E jamais será restaurada em Atenas, ao sopé da Acrópole, a Ágora onde uns poucos se reuniam em nome de uma pseudo-democracia,depois tornada ícone da burguesia alvoraçada...
A verdadeira democracia só virá depois de uma reforma agrária radical, da desapropriação dos bancos, dos grandes complexos industriais, da reestatização da Petrobras, da Embraer, da Companhia Siderúrgica Nacional, da Usiminas. Da redefinição do papel do Estado, do Parlamento, do Judiciário.
Depois de um rearanjo geral na face da Terra...
Não circulei por três continentes em vão. Ia estudando reação do povo, diante de sua própria realidade. Desde o aeroporto de Roma, ao de Atenas. Do aeroporto do Cairo ao de Amã, na Jordânia e daí ao de Tel Aviv, em Israel. E em Alexandria, Nazareh, Tiberias, à beira do Mar da Galileia, onde o profeta,maior, Jesus Cristo, andou sobre as águas...Em Jerusalém, nova e velha, em Belém, com o povo sonhando com o Estado da Palestina...
Enquanto minhas pernas permitiam, em cada localidade só vi contradições sociais. Gente muito rica ao lado de gente muito pobre...
Jamais poderia imaginar que, numa terra dada por Deus aos antigos hebreus, seus descendentes hoje deparam com humilhantes casebres, muito mas muito mais pobres do que os das piores favelas brasileiras, como o verificado quando se deixa, de carro, Tel Aviv e se ruma para Jerusalém.
Então esta é a terra onde jorra leite e mel? Só se for para os judeus mais afortunados...
Mas vida tem dessas coisas, alguém poderia argumentar...As muralhas de Jericó não caíram para esse gritante contraste, rebato. Tampouco os mártires de todos os tempos, bíblicos ou não...
Detenho-me diante de um quadro de horror. O do Holocausto. Horas de visita, lágrimas mal- disfarçadas, irritação com aqueles que negam a existência do pior crime já cometido contra a humanidade.
O Museu do Holocausto precisa e deve ser visitado por todos. Visita que paga uma viagem...A constatação de que um dia um louco ousou pintar o quadro mais trágico de toda nossa civilização.
O cheiro ácido dos fornos cremátórios, os corpos magérrimos em covas comuns, os trilhos, o meio vagão, simbolismos de uma era em que seis milhões de seres humenos foram vítimas da "solução final" ( três mil só na então União Soviética, igual número na Polônia e o restante da Europa ainda me tocam. Me tocarão para sempre.
Assim como o grande salão das estrelas, cada uma delas formada por uma criança sacrificada em nome do poderio nazi-fascista.
Uma cavidade no cimento frio do Museu: sapatos e mais sapatos. Calçados de detentos inúmeros, alguns na flor da idade, como diriam os velhos poetas burgueses...
Só, na , minha cama bastante fofa, com um ar condicionado barulhendo, continuo a ouvir o som imortal de um trem para Sobibor...Quanto deles levaram milhões para a humilhação e para a morte?
Um dia , tomara que não tarde, todos só viveremos de boas recordações, de solidariedade sem fim, de amor, de eterna confrfaternização.
De cada um conforme sua capacidade para cada um segundo a sua necessidade...








Comentários

Anônimo disse…
Que lindo! Foi uma honra viajar ao seu lado.