Um desserviço à Nação



REFLEXÃO DE SEMANA SANTA

Na lógica anticristã do capitalismo,
socorro econômico é coisa pra rico

*Carlos Lúcio Gontijo







A realidade é que, se há gente que pode comer quatro bifes por dia, é porque um contingente imenso de pessoas não come bife algum todos os dias

As instituições públicas, bem como todas as instâncias políticas e judiciais, precisam se ver como meras prestadoras de serviço e ter a noção exata de que, quando desservem à nação, são em sua totalidade responsáveis pelo produto final apresentado ao povo. A generalização se explica e faz sentido, pois cabe ao dono dos bois, ou aos que são parte integrante da entidade pública flagrada em atitude comprometedora, nomear os colegas relapsos e até mesmo punir ou excluir os responsáveis pela mácula detectada pela sociedade. Não passa de comodismo, descompromisso, corporativismo e omissão o ato de se dizer honesto em meio ao desmando e, ao mesmo tempo, tomando-se como alva flor do lodo, exigir da população e da imprensa que apontem os corruptos.

Independentemente do setor e da área a que olharmos, podemos vislumbrar pontos obscuros e contrários à boa administração da chamada coisa pública – cada vez mais tratada como coisa de ninguém. Ainda agora, na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), surge a denúncia de que a escolha de uma professora para vaga na Faculdade de Arquitetura sofreu a influência do marido, coincidentemente chefe do departamento solicitante da seleção e preenchimento da vaga.
Contudo, saindo da área da educação, que deveria nos servir de exemplo, temos o escândalo do Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais (TRT) naufragado no submundo do nepotismo, por intermédio da contratação de parentes para cargos comissionados, prática vedada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). A constrangedora situação liga o sinal vermelho para os trabalhadores que buscam o TRT com a finalidade de obter um julgamento competente e justo às suas quizilas trabalhistas, que necessitam ter apoio de instância judicial sem nódoa, independente e capaz de espargir respeito num país em que nos deparamos com a existência de trabalho escravo até os dias de hoje.
Ao que parece, a população brasileira não tem mesmo com quem contar. Em Minas Gerais, mais uma vez como símbolo de mau exemplo, o Tribunal de Contas do Estado (TCE), que deveria fiscalizar os balanços contábeis das prefeituras e do próprio governo mineiro, é pego chafurdando no lamaçal da submissão ao jogo da influência fisiológica e consequente engavetamento de processos.
Entretanto, se deixamos as montanhas de Minas Gerais e nos dirigimos ao Planalto Central, temos Brasília com seus dispêndios congressuais perdulários, onde a gastança às custas dos cofres públicos chega à beira do inimaginável para nós contribuintes e simples mortais da mal remunerada labuta cotidiana.
Porém, se deixamos Brasília e nos fixamos na análise da crise financeira mundial, descobrimos que a lógica do capital é agir em prol da manutenção eterna de pequenas ilhas de prosperidade extrema em detrimento de extensas e populosas periferias ardendo no fogo da pobreza e da miséria. Basta um rápido estudo do plano de resgate direcionado aos bancos norte-americanos – premiados com dinheiro dos pagadores de imposto ao governo – que abocanharam a astronômica quantia de 700 bilhões, mais os 500 bilhões que lhes haviam sido entregues, para que cheguemos à conclusão de que o fim da pobreza no mundo não figura sequer em segundo plano dos governantes e das elites dirigentes – ou seja, está completamente fora de questão!
Senão vejamos: o Planeta tem 6,7 bilhões de habitantes. Então, se tivéssemos a decisão cristã e humana de dividirmos tão-somente os 700 bilhões entre os 6,7 bilhões de pessoas que habitam a Terra, estaríamos destinando 104 milhões a cada um e teríamos o fim da falta de consumidores e, certamente, os que devem prestação de casa própria teriam plenas condições de quitá-la, colocando ponto final à propalada bancarrota provocada pela ganância dos gestores do setor financeiro.
Quimera tola e vã da nossa parte tal imaginação, pois não existe produto para o consumo de todos. Ou seja, a realidade é que, se há gente que pode comer quatro bifes por dia, é porque um contingente imenso de pessoas não come bife algum todos os dias. Enfim, a inconfessável lógica anticristã do capitalismo vigente é despender todos os esforços para se afastar da democratização da economia feito o diabo da cruz, ao passo que cuida de deixar claro que os cidadãos que não estão nas prateleiras mais altas da escala salarial são indivíduos incompetentes, preguiçosos e invejosos, pois não souberam se utilizar do leque de oportunidades que lhes foram (e são) abertas pelo deus mercado ora socorrido pela água benta dos cofres públicos abastecidos e sustentados pelo povo desprezado e sofrido. Imagem:Telesur


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