"A imprensa mudou de posição rapidamente", diz pesquisadora sobre Golpe Militar

                                                                               
                         "Última Hora" foi o único jornal contra o golpe - Reprodução
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Lucas Carvalho (*) | 31/03/2014 15:30
  

A partir desta segunda-feira (31/3), semana em que completam cinquenta anos do Golpe Militar no Brasil, IMPRENSA apresenta uma série sobre o envolvimento dos meios de comunicação no processo que levou as Forças Armadas ao poder em 1964. Na primeira reportagem, a historiadora e pesquisadora da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Alzira Alves de Abreu, fala sobre como a imprensa se encaixava no contexto social e político da época.

Alzira é autora do livro “A Modernização da Imprensa” (2002) e da pesquisa que resultou no artigo “A imprensa e seu papel na queda de João Goulart”, publicado pela FGV. Segundo ela, os principais veículos de comunicação brasileiros na época se posicionaram claramente em favor do golpe militar, que tirou do poder o então presidente João Goulart.

Jango, como era conhecido, sofria uma grande “desconfiança” por parte de diversos setores, que temiam que o novo presidente levasse o País a um regime comunista. Um golpe militar chegou a ser tramado na época de sua posse, em 1961, mas sem sucesso.

“Quando se dá a renúncia de Jânio Quadros e João Goulart tinha que assumir porque era o vice-presidente, a grande maioria da imprensa apoiou a posse de Jando em nome da preservação do regime democrático. Com exceção de dois jornais: O Globo, do Rio de Janeiro, e O Estado de S. Paulo. Mas a maioria defendia que tinha que se obedecer a Constituição”, afirma Alzira.

A historiadora ressalta que os jornais começaram a mudar de lado com relação ao governo de Jango em 1963, seis meses antes do golpe, no movimento conhecido como “a revolta dos sargentos”. Em 12 de setembro daquele ano, oficiais da Marinha e da Aeronáutica tomaram prédios públicos em Brasília como resposta à decisão do Superior Tribunal Federal (STF) de impedir que militares assumissem cargos públicos no Poder Legislativo.

“Ali, os jornais começam, claramente, a se afastar de Goulart. Achavam que ele estava tentando ir para o regime comunista. A imprensa começa a pedir a saída de Jango ainda dentro da Constituição, pedindo seu impeachment. E o comício das reformas [março de 1964] acelerou, estimulou o medo da classe média da implantação do regime comunista”, diz Alzira.

Segundo a pesquisadora, os movimentos contra o governo de Jango se manifestavam em diversos setores da sociedade e não somente na mídia. “Dentro da imprensa haviam jornalistas que eram anticomunistas, assim como haviam políticos, havia também na Igreja Católica… Era uma disputa, dois movimentos muito fortes em oposição: a esquerda e a direita. E isso também existia na imprensa”, afirma a pesquisadora.

Apesar do apoio ao golpe num primeiro momento, os grandes veículos mudaram novamente de posicionamento em seguida, mesmo antes da instauração Ato Institucional Nº 5 (AI-5), que formalizou as práticas de censura no Brasil. “Muitos jornais que apoiaram a chegada dos militares, logo depois, quando começaram as prisões, a censura, já começaram a se afastar e a criticar.”

A historiadora conta que muitos veículos manifestavam sua insatisfação com o regime nas entrelinhas, através de reportagens especiais que apontavam os problemas sociais do País. Ela cita como exemplo os cadernos de economia: “Os jornais começaram a utilizar estudos de economistas, de especialistas para poder criticar o regime. E também usaram muitas charges, várias estratégias para criticar os militares. Muitos, porém, foram presos.”

Alzira conclui que, por mais que a imprensa tenha tido papel fundamental na instauração do regime militar, ela sozinha não foi a principal responsável. “Ao mesmo tempo em que a imprensa divulgava essa histeria contra o comunismo, por outro lado os outros grupos também estavam muito insatisfeitos com a política do Goulart. Então, foi tudo junto. Não se pode dizer que só a imprensa fez isso. A imprensa, no fundo, apenas refletia o que estava se passando”, conclui.

Veja alguma capas:

(*) Com supervisão de Vanessa Gonçalves

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