EM DEFESA DOS POVOS INDÍGENAS

                                                 
O professor doutor Pablo Lima é candidato a senador pelo PCB
Pablo Lima 

Desde 2010 eu sou professor do curso de Formação Intercultural de Educadores Indígenas (FIEI) na Universidade Federal de Minas Gerais. Trata-se de um curso regular ofertado para estudantes indígenas com o objetivo de formar professores para atuarem na educação indígena diferenciada, com ênfase em uma de quatro áreas do conhecimento (Ciências Sociais e Humanidades; Línguas, Artes e Literatura; Ciências da Vida e da Natureza; e Matemática). 

Porém, muito mais do que ensinar, o que eu mais tenho feito no contato com os povos indígenas é aprender. Aprender sobre as realidades indígenas, suas culturas, valores, hábitos, os problemas enfrentados, as perspectivas de suas lutas. 

Aprendi, acima de tudo, a respeitar e valorizar os povos indígenas. Por isso, sinto-me no dever de defender os direitos desses povos. Além do FIEI, tenho tambem trabalhado com a arqueologia e a história indígenas em Minas Gerais. 

No mesmo ano de 2010, participei, junto com o arqueólogo Gilmar Henriques, da fundação do Museu Arqueológico do Carste do Alto São Francisco (MAC-ASF), na cidade de Pains, MG. Este museu conta com um rico acervo de cultura material dos povos indígenas que habitaram a região nos últimos 10 milênios. Atualmente, eu ainda sou o coordenador do Acervo Indígena da UFMG, situado na Biblioteca Universitária, no Campus Pampulha.  

O Brasil é um país indígena. De acordo com o IBGE, aproximadamente 900 mil brasileiros declararam ser indígenas no censo de 2010. Ao todo, o mesmo censo identificou 305 povos indígenas distintos, que falam 274 línguas diferentes. 

Além dos povos indígenas, a herança indígena está nos traços físicos, na cultura, na alimentação, nos hábitos do dia-a-dia, na religiosidade e nas formas de pensamento da maioria da população brasileira. 

Esses povos, que habitam o território brasileiro há 12 mil anos, desenvolveram línguas próprias, conhecimentos sobre o ambiente, a fauna e flora, domesticando diversos vegetais que se tornaram alimentos básicos em todo o mundo: milho, mandioca, feijão, tomate e batata, em diversas variedades, todos alimentos nativos da América do Sul. 

Podemos tranquilamente dizer que foram os povos indígenas que salvaram a humanidade da fome ao mesmo tempo em que perderam a maior parte de suas terras, muito de suas culturas, e muitos parentes para as doenças e guerras coloniais.

                                                             
 Índios Krenak, em seu território, no município de Resplendor, MG.

Do início da colonização até a década de 1960, a relação entre o Estado português, e posteriormente, brasileiro, e os povos indígenas foi trágica. Além da grande perda populacional (de mais de 10 milhões de habitantes em 1500 até os menos de 1 milhão atuais), muitos indígenas perderam suas terras, seus laços familiares, foram escravizados, torturados, enfim, sofreram todo o tipo de barbárie por parte dos povos “brancos” ocidentais que colonizaram o Brasil. Em alguns momentos, o Estado chegou a declarar guerra de extermínio a diversos povos indígenas, como ocorreu em 1807, no vale do Rio Doce. 

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 Estudantes indígenas e professores no Museu Arqueológico do Carste do Alto São Francisco, em Pains, MG.

Em 1910 foi criado o Serviço de Proteção ao Índio (SPI). Esse órgão federal foi marcado pela corrupção, abuso de poder, perseguição e todo tipo de desrespeito aos direitos dos povos indígenas que deveriam estar sendo defendidos! Em 1967 o SPI foi extinto, e foi criada a Fundação Nacional do Índio (FUNAI), que passou a atuar de modo mais correto em defesa dos povos indígenas, em especial na demarcação de territórios indígenas. 

A Constituição de 1988 tem um capítulo exclusivo dedicado aos índios (vejam abaixo). Hoje, compete à FUNAI, que é um órgão do Ministério da Justiça, subordinado ao Poder Executivo (Presidência da República), identificar, demarcar e homologar territórios indígenas no país.


 Arqueólogo Gilmar Henriques, estudantes do FIEI e outros cursos e professores da UFMG 

em trabalho de campo em Pains, MG 

Desde a aprovação da Constituição de 1988, os povos indígenas cresceram em termos populacionais e conquistaram o direito de permanecer em muitas de suas terras, que hoje correspondem a cerca de 12% do território nacional. Muitos outros direitos começaram a ser acessíveis a esses povos, como o direto à educação escolar indígena diferenciada, a cuidados de saúde, com respeito à cultura indígena, além de alguma infra-estrutura de comunicações e transportes, ainda muito precárias.

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 Estudantes indígenas e professores do FIEI em trabalho de campo em Pedro Leopoldo, MG.

Atualmente, 12 povos indígenas diferentes vivem em Minas Gerais: os Aranã, Araxá, Kaxixó, Krenak, Maxakali, Mokuriñ, Pankararu, Pataxó, Pataxó Hã-hã-hãe, Puri, Xacriabá e Xucuru-cariri. A maior população indígena no estado encontra-se no município de São João das Missões, onde vivem os Xacriabá. Segundo a Fundação Nacional de Saúde (FUNASA), a população Xacriabá era de 8.419 indivíduos em 2010.  

Infelizmente, nestes últimos 26 anos desde a Constituição de 1988, muitos povos indígenas passaram a ser mais ameaçados pela expansão do agro-negócio e por grande obras de infra-estrutura nas regiões Centro-Oeste e Norte do Brasil. Hoje a situação de vários povos indígenas é dramática, como no caso dos Guarani-Kaiowá, que não possuem o direito à terra e vivem às margens de rodovias no estado do Mato Grosso do Sul, sendo constantemente violentados, com seus líderes assassinados por jagunços. Assim como os diversos povos indígenas da região do Xingu, cujas vidas estão sendo ameaçadas pela construção da usina hidrelétrica de Belo Monte. 

Enquanto isso, no Congresso Nacional os povos indígenas não tem qualquer representação. Mas não é apenas isso. Desde 2000 tramita no Congresso a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215, que visa retirar do Poder Executivo a autoridade de estabelecer Territórios Indígenas, e passar essa atribuição para o Congresso Nacional. Se atualmente os índios enfrentam dificuldades na relação com o Executivo, imaginemos como seria esta relação com o Congresso, onde existe uma forte bancada ruralista, que está de olho nas terras dos índios!

Por isso eu me manifesto EM DEFESA DOS POVOS INDÍGENAS:

* Contra a PEC 215!

* Pela imediata homologação de todos os territórios indígenas já identificados e demarcados.

* Pela garantia da soberania dos povos indígenas sobre seus territórios.

* Por mais recursos para a Saúde Pública em territórios indígenas.

* Por mais recursos para a Educação Escolar Indígena Diferenciada, dentro de um Sistema Nacional de Educação Pública.

* Por mais infra-estrutura de habitação, transportes e comunicações em territórios indígenas.

* Por respeito aos direitos garantidos aos povos indígenas pela Constituição de 1988.



Vejam o que a Constituição atual prevê sobre os indígenas:

CAPÍTULO VIII
DOS ÍNDIOS

Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.

§ 1º – São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.

§ 2º – As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.

§ 3º – O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei.

§ 4º – As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis.

§ 5º – É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, “ad referendum” do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco.

§ 6º – São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa fé.

§ 7º – Não se aplica às terras indígenas o disposto no art. 174, § 3º e § 4º.

Art. 232. Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo.

Fontes:

http://www.mac-asf.blogspot.com.br/

https://www.bu.ufmg.br/noticias-eventos/950-obras-do-acervo-indigena-da-ufmg-sao-expostas-na-biblioteca-central-

http://indigenas.ibge.gov.br/video-2

http://indigenas.ibge.gov.br/graficos-e-tabelas-2

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

http://www.anai.org.br/povos_mg.asp

http://www.fmdh.sdh.gov.br/index.php/pt/noticias/324-liderancas-indigenas-se-manifestam-contra-a-pec-250-no-fmdh

http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=14562


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