Metamorfose da “doutrina Obama”


Manlio Dinucci


O “democrata” Obama, que se apresentou como uma «pomba» – laureado inclusivamente com o Premio Nobel da Paz– prossegue agora fundamentalmente a estratégia do republicano Bush, o «falcão», de aberto apoio à intervenção armada onde quer que seja. O imperialismo está revestido da sacrossanta “responsabilidade de proteger”.

Depois de ganhar o apoio dos eleitores com as suas críticas à política externa dos «neoconservadores», Barack Obama rodeou-se no seu segundo mandato de «falcões liberais», encabeçados por Samantha Power. Se os primeiros eram principalmente jornalistas trotskistas judeus que queriam organizar a revolução mundial da democracia, os segundos são geralmente jornalistas moralistas vinculados a Israel que consideram que a «América», leia-se Estados Unidos, tem o dever de proteger as populações civis dos desmandos dos seus próprios governos. ¿Que têm em comum? Todos promovem o intervencionismo do Imperio estado-unidense.

A embaixadora Samantha Power casou-se em 2008 com o professor Cass Sunstein, o conselheiro de Barack Obama que vê Thierry Meyssan como o líder de um movimento extremista mundial anti-estadounidense e que aconselhou a infiltração de agentes nos grupos que põem em dúvida a versão oficial dos atentados do 11 de Setembro.

Durante o seu primeiro mandato, o presidente Obama distancia-se formalmente da política externa e militar do seu predecessor, Bush Jr., dando a impressão de que os Estados Unidos já não pretendem continuar a ser «o policia do mundo» e que desejam retirar-se no plano militar, tanto no Afeganistão como em outros países, para se concentrarem nos seus problemas internos. 

Assim nasce o que foi definido como a «Doutrina Obama». Mas não é por ela que a guerra desaparece da agenda da administração Obama: assim o demonstra a guerra contra a Líbia, dirigida em 2011 pela OTAN – organização encabeçada e comandada pelos Estados Unidos – com um ataque aeronaval massivo e mediante a utilização de forças apoiadas e infiltradas a partir do exterior.

No início do seu segundo mandato, o presidente Obama anuncia que «os Estados Unidos estão a virar a página». Mas a página seguinte é também uma página de guerra. A nova estratégia prevê o uso de forças armadas mais flexíveis e capazes de movimentar-se rapidamente, dotadas de armas cada vez mais sofisticadas no plano tecnológico.

Prevê, ao mesmo tempo, um uso cada vez mais extenso e intensivo dos serviços secretos e das forças especiais. Na nova maneira de fazer a guerra o ataque aberto é preparado e acompanhado pela acção encoberta para minar o país a partir de dentro. Assim se fez na Líbia e assim está agora a ser feito na Síria, armando e treinando «rebeldes», que na sua maioria não são sírios e muitos dos quais pertencem a grupos islamistas oficialmente considerados como terroristas.

E ao mesmo tempo o presidente Obama enuncia a nova «estratégia contraterrorista». A «guerra ilimitada contra o terror» converte-se numa serie de «acções letais selectivas» que apontam para «desmantelar redes específicas de extremistas violentos que ameaçam a América» [Leia-se Estados Unidos]. Nessas acções utilizam-se cada vez mais os drones armados, cujo uso é apresentado como «legal» porque os Estados Unidos estão a travar uma «guerra justa e de autodefesa».

O democrata Obama, que se apresentou como uma «pomba» – laureado inclusivamente com o Premio Nobel da Paz–, prossegue agora fundamentalmente a estratégia do republicano Bush, o «falcão», de aberto apoio à intervenção armada.

¿Como se justifica essa metamorfose?

É aqui que entra em cena Samantha Power, ex professora em Harvard. No seu livro mais conhecido, ganhador do premio Pulitzer, Samantha Power desenvolve as teorias jurídicas do polaco convertido em estado-unidense Raphael Lemkins, criador do termo «genocídio» e conselheiro do tribunal de Nuremberga, teorizando sobre «a responsabilidade de proteger» que os Estados Unidos supostamente assumem na «era do genocídio».

Power entra no Conselho de Segurança Nacional – órgão reservado às eminencias das forças armadas e dos serviços secretos estado-unidenses, cuja tarefa consiste em aconselhar o presidente em política externa e no plano militar. Obama coloca-a depois à cabeça do novo «Comité para a Prevenção de Atrocidades» e posteriormente nomeia-a representante dos Estados Unidos na ONU.

Samantha Power é a principal artífice da campanha de preparação da guerra contra a Líbia, apresentando-a como uma guerra necessária para pôr fim à violação dos direitos humanos. Também é ela quem, invocando o mesmo motivo, pressiona para que os Estados Unidos bombardeiem a Síria.

E a mão hábil de Samantha Power está seguramente por detrás do recente discurso de Obama na Assembleia General da ONU. Sobretudo quando afirma que, perante os conflitos no Médio Oriente no norte de África, «o perigo para o mundo não é uma América [Estados Unidos] demasiado impaciente por se imiscuir nos assuntos de outros países» mas que os «Estados Unidos possam desinteressar-se criando assim um vazio de liderança que nenhum outro país está disposto a preencher».

Os Estados Unidos reclamam portanto o direito de intervir militarmente onde quer que seja, não em resultado do seu próprio interesse mas porque os Estados Unidos estão investidos da sacrossanta «responsabilidade de proteger».

Il Manifesto / Red Voltaire (Com Odiario.info)

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