Voto livre já!


                                                                                 ebastião Moreira (reprodução)

O Brasil deveria acabar com o voto obrigatório. Se políticos não conseguem motivar eleitores a participar de decisões relevantes para a sociedade, não adianta forçá-los a ir às urnas, afirma a colunista Astrid Prange.

Astrid Prange (*)

Caros brasileiros, o voto obrigatório é um serviço à democracia? Quanto mais as eleições de 7 de outubro se aproximam, maiores são as minhas dúvidas. Parece que, a cada dia que passa, aumentam as incertezas e as contradições politicas na campanha eleitoral.

Nunca antes na história deste país tão querido, tantas pessoas quiseram anular seu voto. Favorito nas pesquisas, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, provavelmente ficará fora da corrida, e o voto nulo ou branco virou um símbolo de protesto.

O Datafolha reforça essa tendência. Segundo as pesquisas mais recentes, a dinâmica do voto nulo ou branco vem crescendo. O percentual de eleitores que querem aderir a essa prática cresceu de 11% em 2012 para 27% em 2014, e atingiu 32% nas intenções para as eleições em outubro, no cenário que tem Lula fora da disputa.

Uma pequena amostra do que pode acontecer em outubro foram as eleições no fim de semana passado no Tocantins. Os votos brancos ou nulos alcançaram 19%, e as abstenções, 30%. Isso significa, portanto, que quase 50% dos tocantinenses aptos a votar optaram por ignorar os candidatos a governador.

Conclusão: o dever de votar obriga o eleitor a comparecer na urna ou justificar a sua ausência, mas ele não consegue obrigar o eleitor a votar de verdade. Sendo assim, pergunto: por que, então, não acabar de vez com voto obrigatório?

O Congresso teria a possibilidade de apresentar uma proposta de lei pelo voto livre ainda neste período legislativo. Ou será que o medo do eleitor ausente é tão grande que essa reforma política vai ficar engavetada como tantas outras?

O voto obrigatório existe numa série de países. Brasil e Austrália fazem parte do grupo que pune os cidadãos que não cumprem esse dever. Consequentemente, a participação eleitoral costuma ser muito maior que no Reino Unido ou na Alemanha, por exemplo.

Na últimas eleições legislativas na Alemanha, foi o medo dos populistas que conseguiu mobilizar os eleitores. A participação no pleito subiu de 71,5% nas eleições em 2013 para mais de 75% nas eleições de setembro do ano passado.

A participação eleitoral na Alemanha mostra como é difícil despertar o interesse do eleitor. Nos países de voto obrigatório, por sua vez, o comparecimento às urnas costuma girar em torno dos 90%.

Na Austrália, a maioria da população apoia o sistema. Uma frase de um eleitor divulgada pela mídia australiana sintetiza o clima no país: "Confiamos mais no nosso sistema eleitoral do que nos nossos políticos."

Mas ao contrário da Austrália, no Brasil, a grande maioria da população é contra o voto obrigatório. Há quatro anos, uma pesquisa do Datafolha mostrou que 64% dos brasileiros achavam que o voto deveria ser facultativo.

Com voto facultativo, a mobilização do eleitor se torna mais importante. O desafio dos políticos é motivar seus eleitores a participar de decisões relevantes para a sociedade. Se eles não cumprem essa missão, não adianta forçar o eleitor a ir até a urna. O direito de votar é uma conquista democrática. O dever de votar parece uma derrota democrática.

Astrid Prange de Oliveira foi para o Rio de Janeiro solteira. De lá, escreveu por oito anos para o diário taz de Berlim e outros jornais e rádios. Voltou à Alemanha com uma família carioca e, por isso, considera o Rio sua segunda casa. Hoje ela escreve sobre o Brasil e a América Latina para a Deutsche Welle. 

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(*) Astrid Prange  é jornalista da DW

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