Que nunca mais tiremos as mãos de nossas armas

                                                                      

 Helena Silvestre (*)

Eu não pretendia fazer nenhuma superanálise. Muita gente tem me perguntado o que penso sobre o que estamos vivendo e, honestamente, minha opinião é a mesma de anos atrás: o PT não é igual aos partidos da direita tradicional. Ele se gerou no seio dos trabalhadores. Mas deixou de ser dos trabalhadores.

A riqueza que o povo produz escapa (historicamente) de suas mãos e, alienada de seu produtor, se converte em cadeias e grilhões que aprisionam os pés de quem produziu.

Também o PT se gerou no meio dos trabalhadores, foi por eles construído e, depois, ao escapar das mãos da classe, se converteu em correntes para os pés dos pobres.

O PT foi o único partido capaz de reduzir – com a leniência de um setor muito amplo da esquerda – os nossos horizontes. Fomos transformando nossa perspectiva na triste escolha do menos pior, porque agora tem energia elétrica no Nordeste, porque tem Bolsa Família, porque tem Minha Casa, Minha Vida.

Não! Não sou da pequena burguesia ou burguesia branca e escrota contrária às medidas sociais.

Ao contrário, sou das que pensam que Bolsa Família sempre foi muito pouco, tudo que foi redistribuído (não dado) aos mais pobres não foi sequer um traço do necessário, porque era necessário muito mais.

Penso nas pessoas que fizeram campanha para Lula em 1989. Imagino-as dizendo: "Vença seu medo! Vote diferente! Esse aqui vai mudar as coisas! Teremos 70 reais a mais por mês!".

Óbvio que pra quem ganha pouco, 70 reais por mês é dinheiro e faz muita falta. Mas naquele momento, décadas atrás, o PT era a esperança de mudar as condições de nossas vidas, era a possibilidade de sermos orgulhosos de nós mesmos, de provar que trabalhador governa para o bem dos trabalhadores, mudar o país.

Sabemos que as coisas não ocorreram assim. Sabemos que o PT há muito tempo se voltou para a sua nova base social – a dos empresários, rentistas, latifundiários, banqueiros e construtores – e deixou aos pobres os 15 minutos que sobravam da agenda presidencial.

Alguns diziam: "Pelo menos ele atende!" Essa é a ilusão que se quebrou no meio do povo. 
O povo se cansou de ser atendido. O povo queria ver a vida mudar. 

Se ela não muda, se o PT passou a ser mais um partido a serviço da burguesia – ainda que com cores palatáveis – o povo também se comporta com o partido como se comporta com os outros. Quem não foi leal não merece lealdade. É triste ver o PT cair dessa forma.

Sabemos muito bem que impeachment não é a solução, pois deixa nas mãos de um Congresso e Senado afundados na lama a decisão sobre quem é réu e quem é inocente. 

Mas sabemos mtambém que as mães que perderam seus filhos nas mãos de uma polícia que o PT não teve coragem de desmilitarizar não vão ficar mais tristes agora do que antes. Já perderam tudo.

Sabemos que as mulheres que morreram por fazerem abortos clandestinos, porque o PT não teve coragem de descriminalizá-lo, não lamentarão pelo PT, porque já estão mortas e pra elas não há mais o que lamentar.

Eu, de minha parte, vou buscar no mesmo lugar em que o PT se gerou a esperança para o mundo em que acredito e precisamos cada vez mais. Se foi do meio dos trabalhadores que surgiu o PT, é nas lutas no seio dos trabalhadores que o meu tempo será gasto. 

A partir daí, quem sabe, sejamos capazes de produzir outra vez ferramentas e sonhos menos mesquinhos, menos tacanhos, menos pequenos, e possamos outra vez sonhar com um Brasil diferente, com a cautela de nunca mais deixarmos as nossas armas escaparem de nossas mãos.

  
(*) Helena Silvestre é ativista social.

(Com o Correio da Cidadania)

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