Sexo oral com mulher inconsciente por embriaguez não é crime em Oklahoma

                                                                    
João Ozorio de Melo

Um tribunal de recursos em Oklahoma confirmou, na quarta-feira (27/4), decisão de um juiz de primeiro grau, segundo a qual sexo oral não pode ser caracterizado como estupro e também não é crime, se a justificativa da acusação for o fato de que vítima estava inconsciente por consumo de bebidas alcoólicas ou drogas.

Os juízes dos dois tribunais disseram que, embora a decisão desagrade muita gente, a culpa é da legislação de Oklahoma (que, por sinal, não é o único estado americano a ter legislação igual). Pelo menos um parlamentar já prometeu mudar a legislação.

Oklahoma tem uma lei para estupro e uma lei para sodomia. A lei do estupro caracteriza o crime apenas no caso de penetração na vagina, sem consentimento da mulher. E descreve situações em que o crime pode ocorrer, entra elas o fato de a mulher estar inconsciente por embriaguez ou uso de qualquer outra substância.

A lei da sodomia, por sua vez, criminaliza o sexo oral, em algumas circunstâncias. O fato de a mulher estar inconsciente por embriaguez ou por uso de droga não é uma delas. Também são criminalizados na lei da sodomia o sexo anal e a “bestialidade” — sexo com animais.

“Nós não vamos criar um crime onde ele não existe”, disseram os juízes ao procurador do Condado de Tulsa, Benjamin Fu, que se disse “chocado” com a decisão e os acusava de colocar a culpa na vítima por um crime sexual, de acordo com o Oklahoma Watch, o The Guardian e outras publicações.

À época do caso, o acusado era um estudante de 17 anos e a vítima uma estudante de 16 anos. Eles e alguns colegas do colégio consumiram bebidas alcoólicas e fumaram maconha, em um parque de Tulsa. A estudante teria bebido “muita vodca”. Mais tarde, um hospital confirmou que sua taxa de álcool no sangue dela era de 0,341% dg/L — para comparação apenas, mais de quatro vezes o limite legal para dirigir um carro, 0,08%.

Quando ela “apagou”, foi carregada ao carro do estudante acusado. O estudante a levou para a casa dos avós, que se encarregaram de levá-la para o hospital. O sexo oral teria acontecido no trajeto para a casa dos avós. Segundo o estudante, alegou que o sexo oral foi consentido. Porém outro estudante, que pegou uma carona por um trecho menor da viagem, disse à polícia que ela tinha momentos de consciência e de inconsciência.

No hospital, os médicos examinaram a estudante, fizeram exame de DNA dos dois e encontraram DNA do estudante em algumas partes do corpo dela. Ela sustentou, durante exames médicos, interrogatório da polícia e na Justiça que não se lembrava de nada. A possibilidade de estupro (penetração na vagina, no caso) foi descartada.

“O réu não pode ser processado. A sodomia forçada não pode ocorrer quando a vítima está completamente inconsciente no momento do ato sexual de copulação oral, porque a lei da sodomia não menciona incapacitação da vítima pelo consumo de bebida alcoólica. Nós não vamos, a fim de justificar uma condenação, esticar a lei além do significado justo de seu texto”, escreveram os juízes.

Duas especialistas ouvidas pelos jornais disseram que os juízes estão certos. A culpa é da lei obsoleta que define a sodomia — uma palavra que deriva de Sodoma, cujos habitantes praticavam sexo não procriativo. Há uma lacuna imensa entre a colcha de retalhos que é a legislação do país e as ideias mais evoluídas sobre estupro e consentimento.

A reitora da Faculdade de Direito CUNY, Michelle Anderson, que já escreveu extensamente sobre a lei do estupro, disse que a decisão foi “apropriada”, uma vez que se baseou em uma lei, mesmo que “arcaica”. Só a Assembleia Legislativa do estado poderia mudar isso, ela disse.

Michelle Anderson, dirigente do grupo AEquitas, que se dedica a ajudar os promotores em casos de crimes sexuais e violência doméstica, disse que concorda. “Existe um abismo, em alguns lugares do país, entre a lei e as noções mais evoluídas sobre sexo e consentimento”, declarou.

Sodomia e estupro
Houve uma época, na história dos Estados Unidos, que os legisladores estavam preocupados mais em punir relações homossexuais do que cuidar de especificidades da lei. A lei da sodomia já foi usada para punir relação homossexual consentida. Raramente foi aplicada para punir relações heterossexuais, consentidas ou não, que poderiam ser caracterizadas como sodomia.

Em alguns estados, a lei da sodomia evoluiu. Em outros, foi extinta. Mas a lei do estupro é mais clara e mais abrangente, embora difira de estado a estado. Nos EUA, a lei criminaliza o que chama de “conduta sexual criminosa de primeiro grau”, de acordo com o Projeto Pandora.

De uma maneira geral, a lei define estupro como um contato sexual ou penetração que ocorre: 1) sem consentimento; 2) com o uso de força física, coerção, engodo, ameaça; e 3) quando a vítima: a) é incapacitada ou deficiente mentalmente; b) incapacitada fisicamente (devido ao consumo voluntário ou involuntário de bebidas alcoólicas ou drogas; c) está adormecida ou inconsciente.

O consentimento, como em outros países, é o elemento crítico para determinar o crime de estupro. Há considerações sobre isso: 1) silêncio não significa consentimento; 2) consentimento dado sobre qualquer tipo de pressão (força, coerção, etc.) não é consentimento; 3) se uma pessoa está incapacitada devida ao consumo de bebidas alcoólicas ou drogas, não é capaz de dar consentimento. Nesses casos, ocorre o estupro.

Menores de 16 ou 18 anos (dependendo do estado) são incapazes de dar consentimento, perante a lei. Abusos sexuais de menores são definidos como “estupro com violência presumida” (statutory rape), em vista da idade ou incapacidade da vítima. Não importa se o réu não sabia que a vítima era menor de idade.

(Com a Conjur)

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