CONJUNTURA NACIONAL > O PROCESSO DE IMPEACHMENT


                                                            
                                         
                            No reino da chantagem

Alberto Dines (*) em 16/10/2015 na edição 872
    
Concêntricas, simultâneas, articuladas — neste instante estamos engrenados a um sistema de extorsões, incrível, hilariante mesmo, não fosse ele o responsável por estarmos abobalhados à beira do abismo.

Como na inspirada “Quadrilha” de Carlos Drummond de Andrade – “João amava Teresa que amava Raimundo que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili que não amava ninguém…” – um grupo de deputados chantageia Eduardo que chantageia Dilma que chantageia Eduardo que chantageia Janot que não brinca em serviço e só cuida de punir os corruptos.

Encurralado pelas investigações na Petrobrás, o arrogante presidente da Câmara, Eduardo Cunha, baixou a crista e agora parece disposto a afrouxar a pressão pela impugnação da presidente da República. Desde que o governo e seus aliados convençam o Procurador Geral da República a abrandar o ritmo das inquirições que colocam o seu mandato a perigo.

Diante desta portentosa indecência, verdadeira orgia, pergunta-se: porque razão a oposição (sobretudo o PSDB e os independentes do PMDB) não abandona a abominável ambiguidade e entra para valer na cruzada pelo saneamento do comando da Casa do Povo? Se o fizerem, a chantagem de Eduardo sobre Dilma não terá efeito algum e desmonta-se o castelo de areia das extorsões.

Aferrados à obsessão de derrubar imediatamente a presidente da República, os tucanos (ou grande parte deles, principalmente os seguidores do seu presidente, Aécio Neves) não se importaram em transgredir seus postulados e comprometer seu passado desde que, com isso, a permanência de Dilma Rousseff se tornasse insustentável.

Infantilizados, fantasiaram um day after impeachment festivo, numa boa, sem trancos ou turbulências. Não perceberam os riscos de um tiro no escuro, não avaliaram o imponderável, nem os resultados da soma das indignações do lulismo com o desespero dos desgraçados pelo desemprego e pela carestia.

Quem provavelmente acordou Aécio Neves para a realidade foi o comandante do Exército, general Eduardo Villas Boas, através do surpreendente pronunciamento proferido para os novos oficiais da reserva na sexta, 9/10 e divulgado no dia 12/12,pela Folha de São Paulo. O militar lembrou o “risco da crise social com efeitos negativos sobre nossa estabilidade” e que “isso diz respeito às Forças Armadas”. (Veja partes do pronunciamento do general Villas Boas no vídeo extraído da internet)

                                                                    
Não é preciso um grande esforço especulativo para entender texto, subtexto e hipertexto da mensagem dirigida aos novos tenentes da reserva. O general não foi advertido pelo recém-empossado ministro da Defesa, Aldo Rebelo, por ter falado em nome de toda corporação militar.

O presidente do PSDB finalmente conseguiu perceber os perigos de manter na Presidência da Câmara um parlamentar cercado por tantas suspeições e descrédito apenas para obter possíveis facilidades para a tramitação de um eventual impeachment da presidente da República.

A presença de Eduardo Cunha na presidência de uma das casas do Congresso e na contramão do esforço para tirar o país da bancarrota, assusta mais do que o quadro de fragilidades e desorientação exibido diariamente pelo governo.

A mídia cometeu lamentável erro de avaliação ao preferir dar sustos maiores em Dilma Roussef do que em Cunha. Na edição de 3 de Fevereiro deste ano  apenas 24 horas depois do triunfo de Cunha sobre o desastrado rolo compressor do governo que não queria vê-lo na presidência da Câmara, a “Folha” saiu-se com um texto produzido pelo escritório do jurista Ives Gandra Martins admitindo a legitimidade de um impeachment presidencial.

Incapaz de avaliar os inúmeros informes sobre a vida pregressa e o perfil do deputado fluminense — que logo se converteria num dos políticos mais poderosos do país — o jornalão paulistano investiu numa especulação pseudo-jurídica, verdadeira provocação política que certamente produziria mais barulho e mais repercussão do que uma advertência sobre um quase-desconhecido parlamentar fluminense.

Oito meses depois, Aécio Neves admite publicamente um recuo no tácito apoio que oferecia ao presidente da Câmara. Com menos afobação e mais grandeza não teria alimentado um desajuste fiscal com as estripulias irresponsáveis do caudilho provinciano.

Vacilações, corrigem-se, Tiranetes, máfias e chantagens evaporam, não resistem a um dia de entendimento e sensatez

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(*) Alberto Dines é jornalista, escritor e fundador do Observatório da Imprensa. (Com o Observatório da Imprensa. Os grifos são meus, José Carlos Alexandre)

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